Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 20/09/2010

Aluno da Fateo apóia imigrantes bolivianos

Reportagem do jornal Folha de S.Paulo, 16/09/2010:

Boliviano é preso sob suspeita de manter funcionários em regime escravo em SP

Um boliviano de 34 anos foi preso na quarta-feira sob suspeita de por manter seis pessoas da mesma nacionalidade em regime de escravidão, na região do Bom Retiro, no centro de São Paulo. Segundo a SSP (Secretaria de Segurança Pública), o suspeito era proprietário de uma oficina de costura, localizada na rua Solon, e pagava R$ 1,50 por peça confeccionada sendo ainda descontadas despesas com alimentação, moradia e transporte. Ainda de acordo com a pasta, os funcionários trabalhavam das 7h às 22h, e viviam em más condições de higiene e saúde. O caso foi registrado na 3ª Delegacia de Investigações e Infrações contra o Meio Ambiente e Relações de Trabalho, do DPPC (Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania)

Os imigrantes bolivianos residentes em São Paulo vieram em busca do emprego que já não encontravam em seu país, e de uma vida melhor. Muitos deles acabaram encontrando uma vida de sacrifício na ilegalidade, no confinamento e na exploração de uma jornada de trabalho de até 16 horas diárias em oficinas de costura. Mesmo os que já conseguiram regularizar sua situação no país continuam a se encontrar com o preconceito de quem vê o diferente com desconforto. Falta-lhes encontrar solidariedade.

Foi com o objetivo de levar solidariedade e esperança a essa população que o estudante Jorge Esteban Wills Okada escolheu a Pastoral do Migrante para realizar o estágio de promoção humana, atividade obrigatória do currículo da Faculdade de Teologia. Boliviano, há apenas três anos no Brasil, Jorge conhece bem a realidade de seu país de origem e os motivos que fazem famílias inteiras deixarem parentes e amigos para tentar uma nova vida no Brasil. A Bolívia apresenta graves problemas de ordem social e econômica. Para muitas pessoas, a imigração é o caminho para a sobrevivência. São Paulo é o principal destino. Estimativas extraoficiais falam de 100 mil bolivianos vivendo na cidade, mas há fontes que chegam a mencionar um total de 200 mil.

Desde meados dos anos 80 intensificou-se o fluxo de imigrantes bolivianos para São Paulo. Eles se tornaram o maior grupo de imigrantes latinos na cidade. Chegam da Bolívia com destino certo: as confecções. Os donos das oficinas de costura tratam de encaminhar as suas viagens ou eles já vem atrás de familiares que já se encontram aqui trabalhando com costura.

Muitos dos trabalhadores bolivianos são oriundos do município de El Alto, cidade satélite de La Paz. O nome se justifica: está a 4.100 metros de altura. Possui distritos cuja qualidade de vida, em termos de acesso a equipamentos públicos, é pior do que a da zona rural boliviana, bastante empobrecida. É uma cidade de migrantes: quase 40% das pessoas que vivem na cidade nasceram em outro lugar. Segundo a socióloga Iara Rolnik Xavier, em artigo na revista Travessia*, publicação do Centro de Estudos Migratórios, as migrações são fruto da crise econômica e da demissão massiva de trabalhadores das minas de estanho localizadas nos departamentos altiplânicos de Oruro, La Paz, mas, sobretudo, Potosí, entre 1986 e 1987. Grande parte deste contingente de trabalhadores é da etnia aimará. Em El Alto, 75% de seus habitantes declaram a identificação com este povo originário.

O pastor metodista Victor Jora, formado pela FaTeo no ano de 2009, já havia feito seu estágio de promoção humana junto à Pastoral do Migrante, sob coordenação das Congregações dos Missionários e Missionárias Escalabrinianos, da Paróquia Nossa Senhora da Paz, no centro de São Paulo, e indicou a Pedro essa importante campo de trabalho.

Quando Victor realizou seu estágio de promoção humana, a situação era ainda mais precária. Havia muitos bolivianos vivendo na ilegalidade. Clandestinos no país, eles se submetiam a condições de trabalho e vida muito próximas à escravidão. A Pastoral os ajudava, na medida do possível, a libertá-los desta condição. Ajudava-os a regularizar a documentação, a fim de tirá-los da condição de ilegalidade.

Em 2009, um acordo com o MERCOSUL proporcionou anistia para regularizar a situação dos estrangeiros indocumentados no país e os bolivianos foram os que mais se beneficiaram: 17 mil se apresentaram para se regularizar – um número ainda pequeno, se considerarmos as estimativas extra-oficiais.

Segundo Jorge Okada, desde então a situação dos bolivianos que ele assiste na Pastoral do Migrante, tem melhorado um pouco. Mas ainda requer especial atenção. Muitos bolivianos em São Paulo ainda vivem segregados, confinados nas oficinas onde trabalham, comem e dormem, locais insalubres que chegam a abrigar várias famílias.

O confinamento, a falta de assistência médica e as más condições de higiene favorecem o surgimento de doenças graves, sobretudo tuberculose. E os serviços públicos de saúde, quando procurados, nem sempre atendem bem essa população. Os profissionais de saúde justificam-se dizendo que não entendem o que falam os bolivianos. Os bolivianos sentem-se vítimas de preconceito e se isolam ainda mais, o que dificulta a aderência ao tratamento médico e acentua a gravidade das doenças. “Os bolivianos não conseguem se integrar aos brasileiros”, atesta Jorge. “Este é um campo que desafia a Igreja”.

Ele conta que a Pastoral do Migrante tem uma advogada, que ajuda com a documentação, e uma psicóloga. A Casa do Migrante oferece refeições e alojamento, com capacidade para 100 pessoas. Todo o trabalho realizado ali é voluntário. Jorge, como estudante de Teologia, ajuda a mediar conflitos -- “às vezes até matrimoniais”, beneficiado com o conhecimento do idioma e da cultura. Trabalhar contra o preconceito e a baixa auto-estima dos bolivianos em São Paulo é outro desafio. “A maior parte dos bolivianos é de origem camponesa, muitas crianças não falam nem espanhol; falam aymara. O indígena sofre com um senso de inferioridade, pois é visto como subdesenvolvido”, diz ele.

Segundo Jorge, a eleição de Evo Morales tem contribuído de maneira significativa para melhorar a autoestima da população indígena, mas os bolivianos no Brasil ainda têm muito receio de se abrir à comunidade. A mensagem do Evangelho de Jesus, que não distingue cultura ou etnia, traria grandes transformações em meio a esse povo. “Mas a Igreja não pode esperar que os bolivianos a procure. Terá que dar dois passos em direção a eles”.

Suzel Tunes

Com informações da revista Travessia - Revista do Migrante - publicação do CEM – Centro de Estudos Migratórios


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