Esperança à beira do abismo

A problem?tica do suic?dio



Certa vez um colega pastor, de uma denomina??o tamb?m hist?rica, foi abordado por alguns evang?licos acerca da seriedade b?blica da sua Igreja, pelo fato desta acolher o corpo e realizar of?cio f?nebre de um homem que no dia anterior dera cabo a sua pr?pria vida. O fato tinha sido noticiado nos meios de comunica??o e, nas rodas das pra?as daquela cidade, o falat?rio acerca da morte do crente era o assunto do dia. O pastor, com muita humildade, come?ou a argumentar que o morto era uma ovelha querida, crente ativo naquela Igreja, que j? atuara inclusive como professor da Escola B?blica Dominical. Era um mo?o pacato, honesto e trabalhador, marido fiel e bom pai de fam?lia e que, infelizmente tinha um hist?rico de enfermidade emocional e psicol?gica que acompanhava a sua fam?lia, do lado paterno, atingindo geralmente os homens da casa. Pois este irm?o, ?nico crist?o da fam?lia, estava lutando havia muito tempo contra este mal, sendo acompanhado por m?dicos, tomando os rem?dios por eles prescritos, se submetendo a todos os tratamentos, inclusive as orienta?es pastorais, levando uma vida muito seria com Deus e sua Igreja. At? que, n?o mais podendo resistir ?s press?es da vida, aliada a esta maldita depress?o, tombou. O argumento daquele experimentado pastor n?o fora suficiente para convencer aqueles inquiridores e juizes de plant?o que continuaram a afirmar com plena convic??o que todos os suicidas n?o herdar?o o reino de Deus e que a ?Casa de Deus? n?o poderia abrigar tal condenado.


 


Uma breve reflex?o


Os especialistas definem suic?dio como "a autodestrui??o, mediante a supress?o intencional da pr?pria vida", j? para Dietrich Bonh?ffer, seria a "tentativa do homem de dar um ?ltimo sentido humano ?a vida que se tornou sem sentido e um ?ltimo golpe na autojustifica??o". Essa autodestrui??o pode ocorrer de forma violenta ou lentamente, por exposi??o intencional do pr?prio corpo a doen?as e perigos fatais. 


A maioria dos autores classifica o suic?dio em duas grandes categorias, a saber: o suic?dio convencional e o suic?dio pessoal.


O suic?dio convencional inclui os suic?dios tradicionais e os baseados em costumes e culturas de certos grupos. No Jap?o, por exemplo, existe a tradi??o do suic?dio honroso (hara-kiri). Em outras culturas, mulheres se suicidam para acompanhar seus maridos que partiram. Este comportamento ? aceito ali como um ato de hero?smo.


J? o suic?dio pessoal, n?o est? ligado a nenhum fator cultural ou tradicional. A decis?o ? de foro intimo. Algumas pessoas se suicidam por problema de depress?o, outras por uma quest?o de fuga de problemas que julgam imposs?veis se resolverem, por se sentirem tra?das e rejeitadas, querendo chamar a aten??o, outras ainda por vingan?a, por medo, dentre outros fatores e motiva?es.


Os especialistas diferenciam o suic?dio e a tentativa de suic?dio. No caso das tentativas, geralmente s?o usadas meios chamados fracos, que n?o chegam a ser fatais. ? o caso de g?s, drogas, rem?dios em grande quantidade. S?o vitimas de emo?es conturbadas, geralmente atormentadas por problemas amorosos, financeiros, enfermidades incur?veis, quedas morais graves e conflitos familiares. A tentativa de suic?dio corresponde em sua grande maioria a um pedido de socorro. Geralmente a tentativa ? impensada, moment?nea. Segundo estat?sticas, 80% dos casos de tentativas acabam acontecendo devido ? reincid?ncia, da? ser um alerta para a a??o da fam?lia, amigos e, especialmente, a Igreja.


O suic?dio propriamente dito ? o produto de an?lise e pondera??o, quando n?o prov?m de um caso patol?gico, doentio. Neste caso a a??o ? geralmente violenta e fulminante, predominando a vontade expressa de morrer, de autodestrui??o.


Segundo Capelania Hospitalar e Crist?, o psiquiatra R. Gaupp observou "fatores da personalidade tipicamente anormais, levando alguns casos para o campo patol?gico", neste caso uma depress?o de origem end?gena ou psicop?tica, uma doen?a, portanto.


Na B?blia aparecem alguns casos de suic?dio, como o do rei Saul (I Sm. 31:4); o escudeiro do rei Saul (I Sm. 31:5); Aitofel (2 Sm. 17:23); Zinri (1 Rs. 16:18); Sans?o (Jz. 16:30); e, o mais famoso de todos, Judas Iscariotes (Mt. 27:5). Mas, onde se encontra na B?blia, de modo claro e inquestion?vel, que todo/a suicida n?o herdaria a vida eterna? N?o encontramos nenhuma orienta??o especifica sobre o tema.


Se considerarmos que o covarde (algumas vers?es em portugu?s traduzem t?midos), citado em Apocalipse 21:8, seria o suicida, teremos muita dificuldade exeg?tica, pois for?ar?amos a interpreta??o do texto, pois este texto citado versa sobre aqueles que negam a f? para n?o morrer fisicamente, o que ocorre justamente o contr?rio do suicida. Este almeja a morte f?sica, esperando um al?vio imediato as suas tens?es e problemas, pouco se importando, consciente ou inconscientemente, com as conseq??ncias espirituais, bem como a saudade, constrangimento e dor emocional alheia que deixar?.



Entretanto, se seguirmos outra linha de racioc?nio, a de que o suic?dio ? a quebra do 6? mandamento ("n?o matar?s" – Ex. 20:13), pois o praticante deste ato estaria se matando a si mesmo, ainda assim devemos analisar com muita aten??o e prud?ncia, porquanto na pr?pria lei havia os atenuante e os agravantes, o que podemos chamar hoje de crimes doloso (com inten??o), culposo (sem inten??o), legitima defesa, inimputabilidade (cometido por algu?m irrespons?vel por seus atos, a exemplo de menores, e pessoas afligidas por doen?as e ou perturba?es mentais e emocionais), sem ainda falar das guerras ou mortes no exerc?cio da fun??o. Se a pr?pria lei dos homens ? criteriosa quanto ao ju?zo dos fatos, como sermos t?o absolutistas e inclementes?


Durante muito tempo a Igreja Cat?lica, apoiada nas teses de Santo Agostinho e S?o Tom?s de Aquino, n?o realizava funeral e enterro digno aos suicidas. Mais tarde, com novas coloca?es sobre as causas do suic?dio, a Igreja passou o problema para o Estado que, muitas vezes, chegava at? a confiscar bens e aplicar pesadas multas para os familiares dos autoc?das. No s?c. XIX ocorreu um movimento muito forte, por parte dos intelectuais e fil?sofos e surgiu uma mudan?a, passando o suic?dio a ser encarado como uma manifesta??o de loucura e desequil?brio mental.


Todo/a crist?o/? sabe que a vida ? um dom de Deus. Entendemos que ? bem poss?vel um crente no Senhor Jesus n?o pratique conscientemente o suic?dio. Os casos mais prov?veis seria uma profunda depress?o de ordem heredit?ria proveniente da estrutura gen?tica de cada pessoa, ativada provavelmente atrav?s das press?es f?sicas e emocionais que vive o/a homem/mulher moderno. 


N?o devemos esquecer que um suicida ? algu?m profundamente dolorido e decepcionado, que ao tirar a pr?pria vida, indiretamente reparte esta dor e decep??o, aliada a raiva e tristeza, com todos que o amavam. Ele parte, mas deixa atr?s de si toda a sua tristeza, agora herdada pelos seus familiares e amigos que o queriam bem.


O crist?o maduro e sens?vel deve entender que o Senhor n?o o chamou para julgar, mas para atuar como testemunha da gra?a. Suic?dios est?o acontecendo e n?o adianta em nada simplesmente condenar ou fazer que n?o seja da sua conta. Como luz do mundo e sal da terra, os crist?os devem agir de modo profil?tico (preventivo), evitando o autoc?dio, e quando este porventura vier a ocorrer n?o se pode esquecer que existe uma fam?lia e amigos que necessitam de consolo, de um alento, que somente pode ser transmitido pelos portadores das boas novas. Deixemos o julgamento com Deus (Hb. 9:27).


Cumpramos o nosso papel de semearmos sempre esperan?a e vida. Somos ministros/as da reconcilia??o, consola??o e gra?a de Deus, n?o ju?zes e algozes do nosso pr?ximo, principalmente quando estes est?o no abismo, doloridos e sofridos.


Anunciemos a vida.


 


Rev. Andr? Luiz de Carvalho Nunes


Pastor da Igreja Metodista Central de Salvador/BA, te?logo, pedagogo e docente de Teologia Sistem?tica e ?tica Crist?.


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