Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 13/09/2013

manifesto episcopal bispo Luiz Vergilio

(Atos 20.28)

Uma das primeiras manifestações feitas aos colegas pastores e pastoras por ocasião da realização do Ministerial Regional, como bispo eleito para assumir o episcopado na Segunda Região Eclesiástica no ano de 2001, foi a de reafirmar o entendimento próprio de que o episcopado metodista brasileiro é a forma de governo da Igreja, representativo da Ordem Presbiteral. E esta é a guardiã zelosa do magistério pastoral instituído pelas doutrinas, práticas, documentos e herança histórica do metodismo wesleyano; ou seja, é a responsável pela identidade da confissão de fé metodista.

Portanto, se por um lado o carisma do ministério pastoral consagrado e ordenado é fruto do reconhecimento da comunidade de leigos e leigas que, conciliarmente, o acolhe e o legitimam, por outro lado, é na dependência e unção do Espírito que este ministério deve ser exercido. Conforme preconizava John Wesley, no santo ministério da Palavra há que ter o dom, há que ter a graça e, há que ter os frutos.

Assim, o exercício do episcopado metodista implica na administração do poder institucional, a partir de conceitos estabelecidos comunitariamente, ou, conciliarmente; a despeito da natureza limitada da pessoa que o ocupa, e das injunções históricas que concorrem ou confrontam-se nos meandros das articulações políticas que envolvem nossos Concílios, em suas diferentes instâncias. Neste sentido, trata-se da expressão das co-relações de forças, idéias e propósitos estabelecidos pela comunidade de fé, reunida em Assembléia.

E, como não existem relações humanas ou institucionais que não envolvam relações de poder, a prática do episcopado implica, também, em administrar uma instância de autoridade, que se espera ser representativa do poder moderador e referencial do carisma pastoral e presbiteral de toda a Igreja.

Entretanto, em nossa sociedade e nas relações por ela estabelecidas socialmente, o poder é algo que requer sempre uma aproximação cuidadosa. Como tratou sobre este assunto o filósofo Michael Foucault[1], o problema não é o poder em si, mas a forma como este é exercido, pois ele perpassa todas as relações humanas.

Em nosso caso, a dificuldade não está na compreensão da espiritualidade ou carisma presente no homem ou mulher com tal investidura, mas nas nossas humanidades, que afloram a partir de concepções secularizadas de poder que transitam entre nós.

Em nosso contexto social, poder é compreendido como algo que alguém possui em relação aos demais, distinguindo-o (a) hierarquicamente. Algo exercido individualmente, geralmente de cima para baixo. Logo, poder é algo sempre impositivo, posto que arbitrário, sem oferecer possibilidades diferentes para aqueles e aquelas que a este modelo estão submetidas, ou têm suas relações institucionais por ele determinadas. Creio que olhar o episcopado metodista nesta perspectiva tem sido um equívoco.

O poder precisa ser compreendido numa dimensão teológica, como algo concebido, concedido e consentido comunitariamente. Algo que nasce da convicção do serviço e se processa no nível da confiabilidade e do zelo sobre os consensos que se estabelecem em torno dele. Por isso, desejar o episcopado como carisma de serviço é algo bom de desejar, como Paulo, o apóstolo, reconhece ao dizer que quem o aspira, excelente obra almeja[2].

Contudo, é necessário lembrar que o modelo de exercício de poder que assimilamos historicamente da modernidade e ainda presente na chamada pós-modernidade, está relacionado à posse e controle material e pessoal, centralizado no cargo hierárquico. Daí, os que exercem o poder nesta dimensão, em qualquer atividade de representação, necessitam estabelecer um entorno humano de apoiamentos e de identidade político-ideológica. Necessitam de pessoas que orbitam o poder na expectativa de obtenção de privilégios almejados, e não, necessariamente por uma causa pela qual estariam dispostas a abrir mão de qualquer benefício pessoal, ou pela qual fariam qualquer sacrifício.

Esta visão ideológica de poder, interposta em nosso contexto social, tem sido uma das responsáveis pelo esvaziamento do carisma de serviço, na medida em que o prestigio da função está diretamente ligado a uma provável concentração de poder individual que alguém passa a possuir, com direito à concessão dos possíveis privilégios institucionais dele decorrentes.

O poder consentido será sempre fruto de consensos construídos coletivamente, ao qual, por convicção, as pessoas se submetem, e que por ele velam. É o poder que transita pelo convencimento, não pela força persuasiva da função.

Teologicamente, poder é meio de graça, de administrar misericórdia, tendo como parâmetro ético o amor de Cristo, permeando nossas relações enquanto comunidade de fé, e nunca um fim em si mesmo, com o objetivo de exercer-se a autoridade eclesiástica, em sua hierarquia institucional de autoridade última.

Portanto, conjuga-se, carisma e caráter como propriedades indissociáveis de um episcopado concebido teologicamente e estabelecido conciliarmente.

O carisma do serviço episcopal tem em Cristo seu modelo de referencia: Aquele que se esvaziou assumindo a condição de quem serve aos outros [3]. E este servir faculta a homens e mulheres a possibilidade de serem instrumentos de informação e de inspiração para que a revelação dos propósitos de Deus se constitua em valores permanentes do Evangelho para uma melhor qualidade dos relacionamentos interpessoais, eclesiais e à vida em sociedade.

Bispo Luiz Vergílio

[1] A Microfísica do Poder- Michel Foucault (1979)

[2] 1 Timóteo 3.1

[3] Filipenses 3.7


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