Afeto & afago
Luiz Carlos Ramos
Deus cuida de n?s,
veste o l?rio e sustenta o pardal.
Ao som do sil?ncio
se faz ouvir.
No afeto, no afago,
num gesto de amor,
os mist?rios do Universo
cabem na concha da m?o.
[C?ntico lit?rgico "Afeto & afago";
Letra: Luiz Carlos Ramos; M?sica: Lis?te Esp?ndola]
Os principais atores que contracenam s?o, de um lado, um homem rico e importante (principal da sinagoga), chamado Jairo, e, de outro, uma mulher do povo, pobre e an?nima. Em volta do homem rico, est? sua comitiva; em volta da mulher, est? o povo (ochlos). E no centro est? Jesus.
Jairo se aproxima de Jesus confiante, determinado; a mulher se achega atemorizada e tremendo. Ambos precisavam de ajuda. Jairo, confiando em seu prest?gio e influ?ncia, intercede em favor da filha que est? ? morte; a mulher n?o tem ningu?m para interceder por ela.
Jairo pediu-lhe que impusesse as m?os sobre a filha para que fosse curada; a mulher cria que bastava tocar-lhe as vestes para ser curada. Ambos acreditavam que o toque de Jesus era miraculoso.
Jairo pensa ter a primazia, pois ? da elite, mas Jesus se det?m, para atender primeiro a mulher do povo.
Enquanto Jesus se demora no atendimento ? mulher, aos prantos, a comitiva de Jairo traz m?s not?cias: "n?o h? mais o que fazer", mas logo, a mesma comitiva, passa a zombar de Jesus, porque ele insiste em dizer que a menina n?o morreu; enquanto isso, a multid?o, que apertava Jesus, questiona sua pergunta aparentemente sem sentido: "Quem me tocou?" Jesus v? as coisas de uma perspectiva diferente, tanto da comitiva quanto da multid?o.
Mais tarde, a filha de Jairo ser? curada, quando Jesus a tomar pela m?o, falar com ela, pedindo que se levante, e lhe der de comer; a mulher ?, imediatamente, curada ao sentir o poder (dunamis) de Jesus, por meio do toque de suas vestes, seguido da sua palavra: "Filha, a tua f? te salvou."
O modo de tratamento empregado por Jesus para com a filha de Jairo foi: "Menina" (em hebr. Talitha); mas para a mulher foi "Filha" (em gr. thugater). Jesus adota aquela que n?o tinha um pai para interceder por ela. Ambas, a filha de Jairo e a "filha" de Jesus, recuperam a vida.
O toque (das vestes, das m?os), aqui, ? um detalhe que n?o pode ser menosprezado? Nesta hist?ria, Jesus toca e ? tocado. E esse ? um daqueles detalhes que fazem toda diferen?a? pois ? a express?o concreta, vis?vel (sacramental, portanto) de um jeito essencial de ser.
? precisamente esse detalhe essencial que demonstra que a cura, at? mesmo para a morte, para a qual acredita-se n?o haver cura, est? nas rela?es afetivas, nas atitudes carinhosas, nas express?es de amor? e sempre com prioridade para os mais carentes. Essa ? a verdadeira din?mica (dunamis) da cura e da salva??o. O afeto ? o grande ant?doto para as enfermidades. O carinho ? o melhor rem?dio.
M?dicos que n?o amam seus pacientes n?o os curam cabalmente; pol?ticos que n?o amam seu povo o fazem morrer ? m?ngua; pastores que n?o amam suas ovelhas n?o as levam a verdes pastos nem a ?guas de descanso; mestres que n?o amam seus alunos e alunas n?o lhes ensinam o essencial; pais que n?o s?o carinhosos com seus filhos e filhas n?o lhes d?o por heran?a o maior de todos os tesouros: a vida.
Sejamos, portanto, am?veis; e permitamo-nos amar e ser amados, para que possamos tamb?m n?s "sentir no corpo" (v. 29) que estamos vivos e que estamos salvos.
O afeto, o afago, o gesto de amor, s?o aprova de que "os mist?rios do universo cabem na concha da m?o".