Folha de S.Paulo, 25 de fevereiro de 2007
Garotos j? ocupam 60% dos leitos para anorexia no HC
Em 2 meses, tratamento espec?fico para homens j? tem 16 pacientes, 6 deles internados
Psiquiatras e psic?logos tamb?m apontam aumento na procura de meninos em consult?rios; fen?meno ainda ? uma inc?gnita
CL?UDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Tradicionalmente associada ao universo feminino, a anorexia tem atingido cada vez mais homens. Hoje, eles ocupam 60% dos leitos da enfermaria do Ambulim (Ambulat?rio de Bulimia e Transtornos Alimentares) do Hospital das Cl?nicas de S?o Paulo, o primeiro do pa?s a ter um grupo espec?fico para tratar anor?xicos.
Em dois meses de funcionamento, o grupo conta com 16 jovens com idade m?dia de 18 anos em tratamento, seis deles internados porque corriam risco de morte. Eles ocupam seis dos dez leitos do Ambulim, onde antes s? havia meninas. Em 15 anos de exist?ncia, o ambulat?rio s? havia tido cinco casos de anorexia masculina.
O fen?meno ainda ? uma inc?gnita, n?o est? restrito ao HC e est? sendo objeto de pesquisas em v?rios pa?ses. Especialistas em transtornos alimentares tamb?m t?m registrado aumento na procura de meninos em seus consult?rios.
Entre os jovens internados no HC, h? casos dram?ticos. Aos 18 anos, 1m75 de altura, um deles chegou ao hospital com 43 kg, um IMC (?ndice de Massa Corp?rea) de 14 -o esperado ? acima de 19. Antes da interna??o, s? chupava gelo. Outro tem hist?rico parecido: s? comia duas folhas de alface por dia.
Segundo os especialistas, n?o h? diferen?a entre a anorexia feminina e a masculina: em ambos os sexos, come?am uma dieta por se acharem gordos e da? n?o param de perder peso. Quando comem, para aliviar a culpa, provocam o v?mito.
Nos homens, a perda excessiva de peso causa queda dos n?veis de testosterona, perda da libido e atrofia dos test?culos. Tamb?m pode levar a um grau extremo da desnutri??o, em que o ?ndice de mortalidade chega a 15% dos casos.
Foi o medo da morte que levou o baiano Alex a procurar ajuda no HC. Ele desenvolveu anorexia h? 11 anos, quando era adolescente. “Cheguei a pesar 39 kg e ainda me sentia gordo.”
Diagn?stico dif?cil
Para o psic?logo Raphael Cangelli Filho, coordenador do grupo de meninos no Ambulim, o diagn?stico da anorexia em homens tende a ser ainda mais dif?cil em raz?o da escassez de trabalhos cient?ficos e do preconceito em torno do tema.
“Historicamente, os transtornos alimentares est?o associados ao feminino. Muitos profissionais da sa?de n?o est?o familiarizados com o tema e familiares tendem a achar que a recusa em comer ? frescura.”
O psiquiatra T?ki Cord?s, coordenador do Ambulim, avalia que o aumento da anorexia entre meninos se deve, principalmente, ao fato de os homens estarem mais pressionados pela ditadura da beleza. “As grifes internacionais est?o come?ando a colocar n?o mais rapazes musculosos para desfilar, mas aqueles de visual andr?gino, cada vez mais magrinhos.”
J? o psiquiatra Celso Garcia J?nior, coordenador do ambulat?rio de transtornos alimentares da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), acredita que o aumento seja mais reflexo de uma demanda reprimida do que de uma mudan?a do perfil da doen?a.
Ele confirma, por?m, que no seu consult?rio particular ocorreu um crescimento na procura de meninos anor?xicos. No ano passado, atendeu tr?s casos em um per?odo de dois meses. Antes, nunca havia tido esse perfil de paciente.
A mesma percep??o tem a psic?loga Paula Melin, do Nuttra (N?cleo de Transtornos Alimentares e Obesidade), no Rio de Janeiro. Em um per?odo de tr?s anos, ela viu quintuplicar a demanda de anor?xicos.
A exemplo de Cord?s, Melin tamb?m acredita que tem crescido entre os homens a preocupa??o com o corpo perfeito. Ao mesmo tempo, ao emagrecerem muito, acabam v?timas de outro preconceito. “? comum eles ouvirem: “Por que est? t?o magro? T? com Aids?'”
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