Saúde mental.







 

  A Igreja deve ser uma comunidade terap?utica, na qual os membros cuidam uns dos outros. Incluindo pastores e pastoras.


Pesquisas e estat?sticas demonstram: doen?as mentais, como esquizofrenia, depress?o, transtornos obsessivo-compulsivos e ansiedade, representam 14% das doen?as do mundo, mais que o c?ncer ou as doen?as card?acas.


Um artigo publicado em setembro deste ano pela revista inglesa Lancet, especializada em medicina, revela que os males de ordem mental ou emocional respondem por at? 90% de todos os 800 mil suic?dios registrados anualmente no mundo – a grande maioria nos pa?ses em desenvolvimento. Seria poss?vel evitar grande parte desses suic?dios se houvesse preven??o e tratamento adequados. Mas ainda enfrentamos a barreira do preconceito e a dificuldade de acesso aos sistemas de sa?de.


Tal situa??o de car?ncia ressalta a import?ncia da Igreja como promotora de sa?de mental, especialmente por interm?dio do trabalho de aconselhamento realizado pelos ministros(as) religiosos(as), que podem exercer um important?ssimo papel na preven??o e at? no tratamento dos males de ordem emocional. ? o que afirma a psic?loga Roseli K?hnrich de Oliveira, em sua tese de mestrado pela Escola Superior de Teologia, no Rio Grande do Sul. "O aconselhamento pastoral ? acess?vel e gratuito a todas as camadas da popula??o", justifica. Vale lembrar que, segundo a pastora e psic?loga Blanches de Paula,a palavra sa?de ? um termo teol?gico e n?o m?dico. "Sa?de est? diretamente ligada a salva??o. Sa?de no s?nscrito, svastha significa bem-estar, plenitude. O termo soteria, do grego, significa aquele que cura e que ao mesmo tempo ? salvador.J? na l?ngua latina encontramos salus, que incorpora os termos sa?de e salva??o. Numa dimens?o teol?gica, ainda ? importante enfatizar a proposta soteriol?gica do Evangelho apregoado por Jesus Cristo. A proposta do Reino de Deus ? o ser humano de forma integral", enfatiza a pastora.


Contudo, diante de um problema relacionado ? sa?de mental de membro da Igreja s?o comuns duas formas err?neas de lidar com o assunto: 1) o(a) pastor(a) ignora a complexidade do problema, atribuindo-o simplesmente ? falta de f?; 2) o pastor n?o se v? em condi?es de cuidar do problema e o transfere imediatamente para um psic?logo ou outro profissional especializado.


Segundo o pastor e psic?logo Josias Pereira, respons?vel pelo servi?o de apoio ao discente da Faculdade de Teologia da Universidade Metodista de S?o Paulo, a primeira atitude ? a mais comum. Um antigo c?ntico infantil apregoava: "Quem tem Jesus (…) est? sempre sorrindo…"Para o Rev Josias, no entanto, quem tem Jesus tamb?m tem que saber conviver com a tristeza. Isso tamb?m ? ato de f?."A tristeza ? pr?pria do ser humano. Ao negar essa verdade provocamos naquele que sente tristeza um imenso sentimento de culpa; o que ? desumano", afirma. Segundo o pastor, essa nega??o da tristeza est? diretamente relacionada com uma tend?ncia do mundo moderno: a diviniza??o do ser humano. "Fomos criados para sermos humanos, n?o deuses", diz ele.


Assim, muitas vezes ? necess?rio reconhecer a necessidade de apoio de profissional especializado; psic?logo ou psiquiatra conforme o caso. H? quadros emocionais que se apresentam como sintomas de dist?rbios org?nicos e pedem tratamento qu?mico. Esse diagn?stico s? um profissional da ?rea de sa?de pode fazer. Mas o pastor ou pastora pode perceber a necessidade de encaminhamento ao consult?rio do psic?logo ou psiquiatra.


N?o ? muito ? f?cil. Em primeiro lugar, porque os pastores resistem a compreender o ser humano como um todo integrado de mente e corpo. "Eu costumo dizer aos pastores e pastoras: Voc? se limita a fazer ora??o quando ? necess?rio obturar um dente?" , diz Josias. Outro problema ? que, de maneira geral os(as) cl?rigos(as) n?o est?o preparados(as) para identificar a necessidade de encaminhamento. E nos cursos de teologia n?o h? tempo suficiente para aprofundar quest?es relacionadas ao aconselhamento pastoral.Por isso, atualmente a Umesp est? oferecendo um curso de especializa??o em Aconselhamento Pastoral. ? um curso semipresencial, com dura??o de 18 meses, sob a coordenadoria acad?mica da pastora e psic?loga Blanches de Paula.


Contudo, a busca de um atendimento especializado na ?rea de sa?de n?o significa o abandono do trabalho de aconselhamento pastoral. Este ? outro equ?voco no qual incorrem alguns(as) pastores(as).O irm?o ou irm? encaminhados a tratamento m?dico ou psicol?gico tamb?m contam com o apoio pastoral. "S?o dimens?es diferentes e complementares", explica Josias.


Quem cuida do cuidador?


E quando ? o pastor que est? precisando de ajuda? A?, a situa??o torna-se ainda mais complicada. Na disserta??o de mestrado em teologia intitulada Cuidando de quem cuida: um olhar de cuidados aos que ministram a Palavra de Deus, a psic?loga Roseli K?hnrich de Oliveira destaca que, muitas vezes, o pastor ou pastora tem uma imagem idealizada diante da comunidade.De cima do p?lpito ou atr?s de uma mesa do gabinete pastoral, ele se torna modelo de f?, equil?brio e bem-estar.


Se a maioria dos pastores n?o est? preparada para receber ajuda de outros profissionais no atendimento aos membros de sua igreja, pode-se imaginar a resist?ncia a buscar ajuda para si mesmo. A tend?ncia geral ? negar ou ocultar os problemas de ordem emocional. N?o por acaso, os pastores e pastoras s?o alvos f?ceis de desgaste f?sico e psicol?gico. Uma pesquisa realizada h? dez anos pelo psiquiatra Francisco Lotufo Neto, professor da Universidade de S?o Paulo e membro do Corpo de Psic?logos e Psiquiatras Crist?os, j? indicava uma consider?vel porcentagem de pastores(as) sofrendo de transtornos mentais – principalmente ansiedade, depress?o e dist?rbios do sono. Lotufo aplicou um question?rio a 750 ministros religiosos crist?os n?o cat?licos, moradores da cidade de S?o Paulo, e constatou que a preval?ncia de transtornos mentais no m?s que precedeu a entrevista foi de 12.5% — 47% receberam esse diagn?stico quando a vida toda foi considerada. Os principais diagn?sticos foram Transtornos Depressivos (16.4%), Transtornos do Sono (12.9%) e Transtornos Ansiosos (9.4%). Problemas financeiros, problemas com outros pastores, conflitos com os l?deres leigos da igreja, dificuldades conjugais, problemas doutrin?rios na igreja e sobrecarga de trabalho foram os principais fatores de stress identificados.


O Rev Josias Pereira lembra que no ano de 1996 uma pesquisa semelhante foi realizada na Igreja Metodista, em ?mbito nacional, por meio de question?rios entregues a todos o corpo pastoral da Igreja. Na ocasi?o, surpreendeu o fato de que os maiores n?veis de stress foram encontrados em cidades pequenas e afastadas dos grandes centros urbanos, mas n?o houve uma avalia??o qualitativa dos dados levantados.


Diante de uma dor emocional, o pastor ou pastora sente a necessidade de se abrir com algu?m, como qualquer outra pessoa. Mas, com quem? O Rev. Josias Pereira percebeu, a partir de relatos ds pacientes que atende em sua cl?nica de psicologia, que os pastores n?o s?o bons confidentes para seus colegas. O sigilo nem sempre ? respeitado e o clima de competi??o que, dominando toda a sociedade, atinge tamb?m a Igreja, inibe os ministros religiosos a revelarem aos seus colegas o que consideram ser fracassos pessoais. Afinal, hoje as pessoas s? querem contar casos de sucesso.


Uma solu??o, sugere Josias, ? que os pastores fa?am terapia em locais distantes de sua casa e igreja. A terapia n?o ? apenas para o caso da exist?ncia de problemas, ressalta ele. ? uma pr?tica de auto-conhecimento. "N?o pode fazer aconselhamento pastoral quem n?o se conhece a fundo", defende.


A necessidade de espa?os para compartilhar sentimentos e receber orienta?es tamb?m foi identificada pela psic?loga Roseli em sua pesquisa de campo, na qual ela entrevistou 38 pastores da Igreja Evang?lica de Confiss?o Luterana do Brasil. 72,2% dos pesquisados gostariam de ter um orientador espiritual, mas apenas 11,1% j? t?m algu?m que os acompanha como supervisor ou mentor espiritual.


A psic?loga sugere, portanto, um trabalho de mentoria – que poderia ser exercido por pastores aposentados, por exemplo. Segundo a psic?loga, as institui?es tamb?m poderiam dar este suporte, promovendo encontros de pastores com enfoque m?dico-pedag?gico, nos quais profissionais de sa?de fossem convidados a dar palestras e esclarecer d?vidas. Cultivar rela?es de amizade, participar de grupos de apoio e ora??o e manter um ritmo de vida balanceado, com momentos de lazer, s?o outras medidas de promo??o de sa?de mental.


Pr?ticas de cuidado


Roseli destaca, ainda, que o cuidado de si mesmo nem sempre ? valorizado em interpreta?es teol?gicas que priorizam o "gastar-se por amor a Cristo". Contudo, segundo a psic?loga, os evangelhos indicam que Jesus n?o se adiantou ao sacrif?cio na cruz. "Pelo contr?rio, muitas vezes retirou-se das situa?es de tens?o, sabendo que ainda n?o era a hora". Assim, ela acredita que o exemplo de Jesus indica caminhos para o necess?rio auto-cuidado daqueles que exercem a miss?o de cuidadores. Ela cita v?rias passagens b?blicas. Em Marcos 6.46, por exemplo, l?-se que Jesus se afasta para orar, subindo a um monte. Em Marcos 6.30, ele recomenda aos ap?stolos que repousem um pouco, "? parte, num lugar deserto; porque eles n?o tinham tempo nem para comer"."O ativismo dos pastores n?o lhes oportuniza o necess?rio sil?ncio para a medita??o, ora??o e leitura b?blica", afirma a psic?loga.


Terapeuta ferido


Roseli tamb?m defende a id?ia, citando v?rios autores, que somente aquele que sofre tem condi?es de exercer o poder curativo, a exemplo de Cristo, que transformou o pr?prio corpo ferido em caminho para a cura. "O exemplo da cruz de Cristo remete ao caminho dos cuidadores e dos que s?o cuidados: n?o h? nega??o do sofrimento, ao contr?rio, ele ? escancarado a fim de que possa haver restaura??o", diz ela.


N?o ? f?cil falar de fragilidade num tempo que enaltece o poder. Da mesma forma, os pastores s?o tentados a se apresentar diante da Igreja como seres infal?veis. Mas o exemplo de Cristo aponta para caminho oposto: "Em Jesus, a concep??o do poder ilimitado, a servi?o dos desejos e vaidade pessoais, ? esvaziada, pois ele se revela na cruz como aquele que, detendo todo o poder, faz da miseric?rdia a sua ?tica. O esvaziamento de poder ? certamente o caminho dos cuidados e dos cuidadores, tornando-se uma f? ligada ao cuidado e, portanto, ligada ? vida". Essa consci?ncia deve estar presente entre cl?rigos(as) e leigos(as) pois, como nos ensina o ap?stolo Paulo, a Igreja ? o corpo de Cristo -todos os membros igualmente importantes, apoiando-se mutuamente para a sa?de do corpo.


Suzel Tunes


 


Para saber mais:


Pastoreando pastores : voca??o, fam?lia e minist?rio. Do Bispo Nelson Luiz Campos Leite, Editora Cedro, S?o Paulo.


O sofrimento que cura. Do te?logo holand?s Henri Nouwen, Editora Paulinas.


Corpo de Psic?logos e Psiquiatras Crist?os. Site http://www.cppc.org.br/


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