Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 13/09/2013

Bispo denuncia no Pará

Paula Laboissière e Ana Luiza Zenker
Da Agência Brasil

Trezentas pessoas que vivem no interior do Estado do Pará estão sendo ameaçadas de morte, por terem denunciado casos de tráfico de seres humanos, exploração sexual de crianças e adolescentes e pedofilia. O número foi apresentado hoje (6) pelo bispo da Diocese da Ilha de Marajó (PA), dom José Luiz Azcona, em reunião extraordinária do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH). Ele é um dos quatro religiosos ameaçados de morte no Estado.

Azcona afirmou que o governo do Pará, apesar de ter conhecimento do número, ainda não tomou providências para reduzir os casos. "Não me preocupa tanto a minha segurança pessoal. Se existem 300 homens e mulheres marcados para morrer, isso indica uma sociedade doente, pobre e moribunda", criticou.

Segundo o bispo, dos 300 ameaçados de morte, apenas 100 estão sob proteção do governo federal. "Tem que ter uma mudança de mentalidade, uma conversão. [É preciso] Olhar para a Amazônia como a Amazônia é, não com os olhos de Brasília."

O bispo disse ainda que há conivência de autoridades locais em casos de "prostituição, tráfico e consumo de drogas e uso de bebidas alcoólicas entre os jovens".

Situação difícil de resolver

Para o bispo da Diocese de Abaetetuba (PA), dom Flávio Giovenale, as denúncias retratam uma situação que não deve ser resolvida facilmente. "Temos problemas que seria ingenuidade pensar que se resolvem facilmente. Alguns foram se acumulando durante anos e não é possível resolver de repente", disse o religioso, que também participa da reunião.

Na reunião, Giovenale disse que há dois meses encaminhou as denúncias à Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) do Ministério da Justiça, mas que ainda não recebeu retorno do governo federal. "Pelo menos uma satisfação, até para nos animar, seria interessante". Para ele, a reunião com o CDDPH representa uma possibilidade de se avançar para reduzir o problema.

Ele destacou que as ameaças de morte provocam insegurança. "As ameaças não deixam [a gente] ficar tranqüilo. Tivemos casos como o da irmã Dorothy Stang em que não houve respeito à idade dela, nem pela situação em que se encontrava", disse o bispo, referindo-se ao assassinato da missionária norte-americana Dorothy Stang, em fevereiro de 2005, no município de Anapu (PA).

A religiosa, que defendia a exploração sustentável da floresta, foi assassinada quando seguia para uma reunião com colonos, para tratar de questões referentes ao Programa de Desenvolvimento Sustentável (PDS).

Ele também citou o caso de dom Ervim Krautler, da Prelazia do Xingu, que está jurado de morte e disse que as ameaças que ele próprio vinha sofrendo cessaram após a nota divulgada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) no último dia 10. O bispo de Abaetetuba começou a ser ameaçado em meados do ano passado, por causa de denúncias de tráfico de droga.

"Mas continua a preocupação em relação a dom Erwin, porque não se sabe nada sobre a investigação. Entendemos que a polícia muitas vezes tem que manter as investigações sob sigilo, mas sentimos falta de comunicação. Pelo menos para quem está diretamente interessado ou ameaçado", afirmou.

Há dois anos, dom Erwin está sob proteção do Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos, ligado à Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH). Há pelo menos 10 anos, ele passou a ser ameaçado de morte, segundo dom Flávio, por denunciar irregularidades no sul do Pará.

Inicialmente, eram casos de grilagem, invasões de terras e extração ilegal de madeira. Há cerca de 10 anos, dom Ervim denunciou a castração de vários meninos da região, que eram seqüestrados e, em alguns casos, mortos.

"A gota d'água foi essa rede organizada em Altamira para a exploração sexual de crianças e adolescentes", disse dom Flávio. "Naquela região, os ameaçadores demonstraram que não era só intimidação, mas que podem concretizar aquilo que ameaçam", afirmou o bisco de Abaetetuba, em referência ao assassinato na religiosa norte-americana Dorothy Stang, na mesma área do estado onde dom Erwin trabalha.

De acordo com o coordenador geral do Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos da SEDH, Fernando Matos, as denúncias estão sendo acompanhadas e investigadas.

Pouco depois da nota publicada pela CNBB, revelou Matos, foi realizada uma reunião com a Polícia Federal para pedir apoio na investigação das novas ameaças. "Desde antes da divulgação da carta da CNBB, a secretaria, por meio da ouvidoria e do Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos, vem acompanhando a situação grave e preocupante das denúncias no estado no Pará", afirmou.

Ontem (23), o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana aprovou a ida de uma comissão especial para ouvir os três bispos ameaçados de morte. "Nós ouviremos pessoalmente os bispos, as suas denúncias, as suas preocupações em relação à exploração sexual infanto-juvenil e ao tráfico de drogas. A partir disso, acionaremos as estruturas policiais do estado e, se necessário, as federais para dar prosseguimento nas denúncias", disse Matos.

No contato com os bispos também devem ser repassadas informações sobre o andamento das investigações, tanto das denúncias quanto das ameaças.


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