Dia da Consci?ncia Negra (e Coletiva)
“N?o sois v?s para mim, ? filhos de Israel, como os filhos dos et?opes?” – Am. 9:7.
Celebramos no pr?ximo dia 20 de novembro o "Dia Nacional da Consci?ncia Negra" – feriado em muitos munic?pios brasileiros. Dia da morte de Zumbi do Palmares, referencial da luta da ra?a negra no Brasil pelo fim da escravid?o e da conquista por igualdade de direitos. Tamb?m ? um dia dedicado ? reflex?o coletiva sobre a hist?ria, a presen?a e import?ncia do negro na cultura brasileira, bem como nas igrejas evang?licas.
A rela??o e reflex?o sobre o negro nas igrejas evang?licas n?o se difere muito da na??o brasileira, passa silenciosamente em muitas denomina?es. Amparado pela capa da irmandade, isto ?, a convic??o crist? de que somos todos irm?os – uma verdade incontest?vel -, n?o se toca nesse tema, todavia o racismo e o preconceito soam velados em muitas igrejas, atrav?s de olhares, palavras, atitudes e decis?es, sendo em alguns casos, abafados.
Alguns autores evang?licos tiveram a coragem de debater esse tema. Entre eles, o historiador Jos? Carlos Barbosa, em sua obra "Negro n?o entra na Igreja: espia da banda de fora" (2002), denuncia o sil?ncio das igrejas protestantes hist?ricas com o tema da escravid?o; o comunic?logo Edilson Marques da Silva, em "Negritude e F?" (1998), indica como os preconceitos produzidos na na??o brasileira e no ?mbito das igrejas evang?licas prejudicam a auto-estima do negro crist?o. Por ?ltimo, o cientista da religi?o Marco Davi de Oliveira, em sua obra "A religi?o mais negra do Brasil" (2004), discute as raz?es da op??o de muitos negros pelas igrejas pentecostais e as tens?es presentes nessa rela??o.
Essas e outras obras sobre o tema servem de alerta para o fato de que a rela??o igrejas evang?licas e o negro n?o ? t?o un?voca assim, deste modo, merece reflex?es s?rias, sem espiritualismos ou ufanismos. Pois como evang?licos, fi?is aos valores de Cristo, que amou e ama a todos indistintamente e lutou sempre pela dignidade das pessoas, n?o podemos reproduzir e/ou perpetuar esquemas preconceituosos no interior de nossas igrejas. Mas semear os valores do Reino de Deus: centrado no amor, dignidade e justi?a.
Entre as iniciativas para romper com esse preconceito velado sugiro o cuidado em nossas igrejas com express?es do tipo: "ovelha negra"; "lista negra"; "a coisa ficou preta"; "amanh? ? dia de branco"; "preto de alma branca"; "os/as n?gos/as n?o prestam aten??o, n?o fazem isto ou aquilo direito"; "servi?o de preto"; "mulato/a"; "denegrir", entre outras express?es.
Qualquer pesquisa r?pida na internet pode apontar o quanto essas palavras s?o nocivas, escondem ou revelam preconceitos em rela??o ao negro, por?m muitas vezes s?o usadas em nossas igrejas livremente. Vale destacar ainda que juntamente com essa a??o em rela??o ?s palavras merece aten??o tamb?m o zelo pela n?o prolifera??o em ?mbito comunit?rio de piadinhas preconceituosas sobre negro, permitir sua propaga??o ou ri das mesmas em qualquer esfera ? legitimar o preconceito.
Outra a??o afirmativa importante passa pela educa??o religiosa produzida no contexto comunit?rio. Neste ?mbito ? poss?vel produzir estudos b?blicos s?rios que evoquem o valor do negro na B?blia, contrastando com as vis?es distorcidas e preconceituosas constru?das historicamente. Neste sentido ? poss?vel resgatar verdades b?blicas encobertas sobre a hist?ria do negro, como por exemplo: o Egito, importante imp?rio antigo, inventor do papiro, fica no continente africano. Ou ainda, que personagens b?blicos famosos do passado como Jos?, Mois?s e o pr?prio Jesus viveram um per?odo na ?frica – no Egito. Sem esquecer passagens como a que aparece na ep?grafe acima, que entre outras coisas afirma o olhar especial Deus pelos negros (Et?opes/Cuxi), a semelhan?a dos filhos de Israel. A?es como essa ajudam no fortalecimento da auto-estima do negro evang?lico.
Refletindo sobre a m?dia produzida em nosso pa?s ? preciso ter em mente que o negro (evang?lico ou n?o) n?o suporta mais o monop?lio visual da m?dia televisiva, impressa (revistas, jornais, etc.) e/ou virtual (internet) que sempre apresentam rostos e personagens euroc?ntricos (brancos, loiros, olhos claros). Vivemos num pa?s mesti?o, em que o negro representa parte significativa da na??o, nada mais natural que tais meios reproduzam essa realidade. De igual modo as Igrejas Evang?licas, comprometidas com os valores do reino de Deus, devem ter cuidado em suas produ?es publicit?rias e incluir o negro evang?lico, para n?o reproduzir a discrimina??o maligna que impera em nossa na??o.
Concluindo, toda e qualquer forma de preconceito fere os ouvidos, os olhos e o cora??o de Deus e deve ferir tamb?m nossos ouvidos, olhos e cora??o como crist?os. Assim como Igreja de Cristo, portadora da maravilhosa mensagem de "boas novas do evangelho" trabalhemos para a constru??o de comunidades crist?s inclusivas e uma sociedade em que reine o amor, a justi?a e a dignidade humana.
Por Rev. M?rcio Divino de Oliveira, pastor metodista, 5? RE, fil?sofo e mestre em Ci?ncias da Religi?o
REFER?NCIAS BIBLIOGR?FICAS
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BARBOSA, Jos? Carlos. Negro n?o Entra na Igreja: Espia de fora. Piracicaba: Unimep, 2002.
CMI. Justi?a Transformadora: ser igreja e superar o racismo. (Cartilha). Su??a: CMI, 2004.
DAMATTA, Roberto. O que faz o Brasil, Brasil? Rio de Janeiro: Rocco, 1984.
OLIVEIRA, Marco Davi. A Religi?o mais Negra do Brasil. S?o Paulo: Mundo Crist?o, 2004.
SILVA, Edilson Marques. Negritude e F?: O resgate da Auto-Estima. Santa Cruz do Rio Pardo: Faculdade de Filosofia, Ci?ncias e Letras "Carlos Queiroz, 1998.