O Vinte de Novembro que neste ano cai numa sexta-feira, j? foi transformado em feriado em onze estados e ser? comemorado em 217 cidades. A data ? feriado estadual em grandes capitais tais como, S?o Paulo e Rio de Janeiro. Por?m, para muitas pessoas, o dia, al?m de proporcionar uma oportunidade de ir pescar no feriado prolongado n?o traz import?ncia alguma, e por isso "passar?
Na realidade, se existe um pa?s fora do continente africano, para quem o Vinte de Novembro deveria ser importante, este pa?s ? o Brasil. Sim, o povo brasileiro deveria conhecer desde cedo a hist?ria por tr?s desta data. Deveria conhecer a pessoa por tr?s desta data, assim como conhece a pessoa e a hist?ria por tr?s de datas como 21 e 22 de Abril, 7 de setembro e outras datas que fulguram no calend?rio c?vico nacional. Teorizo que os brasileiros saibam mais sobre o Halloween, (dia das bruxas) comemorado no 31 de outubro, do que sobre o 20 de Novembro. E olha que o Halloween ? de origem inglesa.
O vinte de novembro est? relacionado a um longo capitulo da hist?ria brasileira, escrito com escambos, seq?estros, sangue, suores, l?grimas, cativeiro, castigos f?sicos e vidas ceifadas. A data esta ligada a um per?odo, que muitos brasileiros preferiam que n?o tivesse existido na Hist?ria nacional. A escravid?o negra. Tal cap?tulo foi t?o horrendo que o pr?prio Rui Barbosa (1849 – 923) mandou queimar todos os arquivos da escravid?o, onde estavam registrados a quantidades de negros trazidos para o Brasil e o pre?o de cada um. Tal atitude por parte de Rui Barbosa, tornou mais dificil o resgate da verdadeira hist?ria da escravid?o negra. Portanto, para os diversos "Movimentos Negros" atuante no Brasil, seja de cunho politico ou religioso, a data ? de resgate do passado dos descendentes de v?rios povos, tais como: Bantos, Mina, Jeje, Benguela, Youruba, Nago.
O Brasil foi o ultimo pa?s nas Am?ricas a abolir a escravid?o, e s? a aboliu sob press?o da Inglaterra industrializada, que ambicionava expandir seu campo comercial, e para tanto incentivava e criava mecanismos para abolir a escravid?o visando a ado??o do trabalho livre, que gerava novos consumidores. A na??o colonizada por europeus tem tamb?m como base de sua forma??o os elementos: ind?gena e negro. Dos descendentes destas tr?s etnias, os ?nicos que encontram grandes dificuldades em resgatar sua ?rvore geneal?gica ? o afro-brasileiro, pois quando os (tumbeiros) navios negreiros aportavam no Brasil, e as "pe?as" eram levadas para o mercado escravista, as fam?lias eram separadas e vendido cada membro em separado, quebrando-se os la?os familiares, indo pai para um lado, m?e para outro, se ela tivesse filhos ainda de colo, levava-os consigo, se n?o, eles tamb?m tomavam destinos diferentes. Devido a esta desagrega??o familiar, o desconhecimento da ancestralidade, do local de origem e povo de perten?a ? apenas uma das vigentes conseq??ncias da escravid?o negra. Esta consequ?ncia geradora de um “v?cuo geneal?gico” ? apenas uma das conseq??ncias que somada a outras ainda piores precisam ser tratadas por meio do resgate da hist?ria dos afro-brasileiros e afro-latino-americanos. Portanto, Vinte de Novembro ? importante, pois ? uma data preferida pelos afro-brasileiros em detrimento ? data oficial da Aboli??o, em que se reconta a hist?ria e luta de seus ancestrais, e se reinvindica a sequ?ncia da liberta??o, pois a ocorrida a 13 de Maio de 1888 ? ainda um projeto inacabado.
? um projeto inacabado, pois ocorreu sob press?o, e com o prop?sito de beneficiar mais aos escravistas do que aos escravizados. ? um projeto inacabado pois n?o houve por parte dos governantes brasileiros, medidas que buscassem – p?s a assinatura da Lei ?urea, inserir o negro liberto a sociedade.
As medidas tomadas pelo governo visavam mais a exclus?o do que a inser??o social do povo negro, e assim houve projetos governamentais que visavam, por meio do abandono, o exterm?nio do povo negro. Dentro dessa funesta pretens?o, os descendentes dos africanos anteriormente for?osamente inseridos no Brasil, e que sustentaram a economia por quase quatro s?culos com sangue, suor, l?grimas e corpos castigados pelo frio, sol, chibatadas, quando libertos foram preteridos, jogados ? pr?pria sorte. A expectativa governamental era que morressem, dando lugar assim a um povo com tra?os europeus. O governo e grandes setores da sociedade acreditavam que, a popula??o negra "diminuiria progressivamente devido ? alta taxa de mortalidade, maior incid?ncia de doen?as e desorganiza??o social. Os que sobrevivessem, via miscigena??o produziria naturalmente uma popula??o mais clara, uma vez que o gene branco era mais forte.
Al?m da expectativa que os negros libertos morressem, o governo por meio do “decreto de 28 de junho de 1890 determinava que agentes diplom?ticos e consulares brasileiros e a policia dos portos deveriam impedir a entrada de criminosos, mendigos, indigentes e “ind?genas da ?sia e da ?frica”. Somente o Congresso Nacional podia permitir alguma exce??o. O Decreto – Lei n? 7967 de setembro de 1946 determinava que “os imigrantes ser?o admitidos de conformidade com a necessidade de preservar e desenvolver o Brasil, na composi??o de sua ascend?ncia europ?ia”.
Como podemos ver, a entrada do negro como pe?a era largamente permitida, at? a supre??o do tr?fico negreiro ocorrido em setembro de 1850 por meio da Lei Eus?bio de Queiroz, agora ap?s a aboli??o a presen?a dos negros descendentes de escravo se torna estorvo e a entrada de “ind?genas africanos” entenda-se negros, se torna caso de policia. Tudo isso com o prop?sito de preservar “a ascend?ncia europ?ia nacional”.
Neste prop?sito, o Governo investiu pesado na vinda de europeus para o Brasil, visando n?o somente substituir a m?o-de-obra negra, mas tamb?m "embranquecer" a na??o, pois acreditava que a imigra??o orientada refor?aria a predomin?ncia branca. A pol?tica do embranquecimento come?ou dois anos antes da assinatura da Lei ?urea, pois "ainda em 1886, foi criada a Sociedade Promotora da Imigra??o, que com o apoio do governo, subvencionava a imigra??o, pagando atrav?s de impostos, a vinda do imigrante. Chamo a isto de "cotas para brancos", pois os imigrantes com todo incentivo estatal chegavam a um pa?s que ap?s s?culos fazendo uso do trabalho escravo, busca agora fugir dos tra?os negros e se adequarem a modernidade, criando pequenas propriedades e dando apoio ao trabalho livre e assalariado para os brancos.
Hoje, cento e vinte um ano ap?s a tentativa estatal de "branquear" o pa?s, as estat?sticas mostra que tal intento falhou, e o Brasil foi literalmente "denegrido", constituindo-se no segundo maior pa?s do mundo em popula??o negra, perdendo apenas para a Nig?ria, um pa?s africano. Em 2010, de acordo com pesquisas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estat?stica), a popula??o brasileira ser? majoritariamente negra. Por?m, na atualidade os negros ganham, em m?dia, 53% da renda do branco, e segundo proje?es do Ipea (Instituto de Pesquisa Econ?mica Aplicada), levar? 32 anos, para haver uma equipara??o.
Al?m dos dados de desemprego, analfabetismo, vitimas de chacinas e etc., a pessoa negra s? alcan?a visibilidade nas Escolas de samba, cantando pagode, ou jogando futebol, pois sua ascens?o social ainda est? ligada ao entretenimento. Atualmente nas novelas as personagens vividas por artistas negros come?am a atuar como protagonistas, deixando de ser personagens secund?rias, como durante muito tempo atuaram, exercendo papeis de cozinheira, faxineira, motoristas, gar?ons, jardineiros e outras fun?es geralmente desempenhadas por pessoas negras na vida real. A ind?stria do entretenimento ? um dos meios por onde o negro pode garantir sua ascens?o social, contudo, s?o poucos os que mesmo tendo talentos, conseguem ascens?o social por meio do esporte ou da vida art?stica, assim como: "Pel?", Alexandre Pires, Ta?s Ara?jo, Dudu Nobre e outras personalidades negras.
Os pioneiros do meio art?stico sofreram bem mais do que os artistas negros da atualidade, muitos j? morreram e talvez as pessoas n?o se lembrem mais sequer de seus nomes, mas n?o se esquecem de suas personagens. Dentre os que j? morreram destaco a personagem do S?tio do Pica – pau Amarelo (
Vinte de novembro ? para negros conscientes de seus valores enquanto pessoas humanas e cidad?s, dia de honrar a mem?ria de Francisco, n?o de Assis, mas sim de Palmares, ou "esclarecendo", Zumbi dos Palmares, como ? conhecido. Ele ? o nome por tr?s da data nacionalmente conhecida como "Dia da Consci?ncia Negra", contudo, ela n?o pretende apontar somente para o ?cone que Zumbi se tornou, antes tenciona chamar aten??o para a luta e resist?ncia do povo negro que nele se inspira.
Dia da consci?ncia negra s? existe porque houve escravid?o, Zumbi s? ? lembrado por que resistiu a esta escravid?o. Ele ? o her?i negro nacional, ?cone da resist?ncia ? escravid?o, o Rei da "Tr?ia Negra", chamada Palmares, erguida por negros aquilombados na Serra da Barriga – Alagoas e que de 1954 at? 1677 derrotou mais de 24 expedi?es militares, mas caiu em janeiro de 1694.
Palmares caiu quando Domingos Jorge Velho a frente de um ex?rcito de mais de 8.000 homens munidos inclusive com canh?es, ap?s muita resist?ncia conseguiu invadi-la e destru?-la. Zumbi e outros negros conseguiram fugir, por?m, um dos negros, fora capturado, e sob tortura relatou onde se encontrava Zumbi, o qual no dia 20 de novembro de 1695, foi capturado por Andr? Furtado de Mendon?a que o matou, cortou sua cabe?a, exibindo-a em Recife. Palmares caiu, mas o sonho de Zumbi, o sonho de ser livre gozando de todas as consequencias da liberdade vive no cora??o de cada afro-descendente que n?o se conforma com o mito da falsa demogracia racial, que colaborou e ainda colabora para a manuten??o de um racismo velado, que por ser velado se torna mais dificil de combater do que a segrega??o racial que existiu de forma institucionalizada nos EUA.
Mesmo que muitas pessoas n?o gostem da id?ia, de um "Dia da consci?ncia negra", ainda mais quando se fala em transformar a data em feriado nacional, o povo brasileiro ? for?ado a falar, ouvir, ler e escrever sobre consci?ncia negra hoje, pois no passado os brancos no poder, ap?s se locupletarem com o trabalho escravo, n?o tiveram consci?ncia e p?s o treze de maio de 1888, abandonaram milhares de pessoas negras a margem da sociedade. Assim, libertos, mas n?o inseridos a sociedade, os negros sa?ram das senzalas e foram para as favelas, sem repara??o, sem indentidades, sem destinos, sem condi?es dignas de vida, mas n?o sem esperan?a e alegria, sendo capaz de transformar o lamento em samba, assim como transforamaram os restos em feijoada e a dan?a em arte de defesa e ataque.
Por isso a data em reflex?o, exalta a mem?ria de Zumbi, pois ? preciso desconstruir no imagin?rio popular os estere?tipos passivos passados pelos livros did?ticos, que contam a hist?ria da escravid?o de forma superficial, mostrando sempre um negro preso a um tronco e um branco com a chibata na m?o. A hist?ria oficial, contada pelos descendentes dos opressores exalta mais o 13 de maio, omitindo as lutas, as revoltas, os abortos de muitas negras que preferiam abortar a "reproduzirem" filhos para serem escravos. Tal atitude de certa forma ? mais digna do que a Lei do Ventre Livre que, "determinava a perman?ncia do filho com a m?e at? a idade de 8 anos completos; depois dessa idade, o senhor da escrava m?e teria a op??o de receber indeniza??o do Imp?rio, no valor de 600$ r?is, (o pre?o de um escravo adulto), ou ent?o de utilizar dos servi?os do pequeno escravo at? idade de 21 anos. N?o precisa de muito esfor?o para se concluir qual era a escolha dos "sinhozinhos".
Por tr?s da data do vinte de novembro h? um passado que esta sendo resgatado pelos afro-descendentes brasileiros, que a cada dia tem sua auto estima restaurada, se orgulhando de ser, n?o descendentes de escravos somente, mas descendentes de povos africanos, que est?o na base da constru??o do Brasil que cada vez mais assume sua heran?a afro. Muitos negros barsileiros descendem de principes e princesas africanas, filhos de reis africanos que tiveram suas tribos vencidas nas inumeras batalhas tribais, amplamente incentivada pelos europeus, a fim de comprarem dos vencedores os vencidos e vendererem-os como escravos para as Am?ricas.
Dia da Consci?ncia Negra ? dia de protestos, dia de festas, dia de cultos, dia de celebra?es, e dia de rememorar e transmitir nossa hist?ria, mesma que ela possua cap?tulos tristes, ? dia tamb?m de nos alegrarmos! ? dia de rememorarmos, pois n?o podemos apagar tampouco nos esquecer do que se passou, pois as conseq??ncias de uma aboli??o mal feita ainda permanecem, separando negros e brancos numa "falsa democracia racial".
N?o podemos deixar de falar daquilo que nossos ancestrais viveram, nosso rememorar deve ser a partir do que disse o sacerdote Rastaf?ri e cantor de Reggae Bob Marley: "Um povo que n?o conhece sua hist?ria reminisc?ncias de seu passado, ? igual a uma ?rvore sem ra?zes". A partir do resgate de nossa negras ra?zes e reflex?es sobre nossa hist?ria ? preciso que passemos para a a??o, tendo como referencial a Zumbi e seu sonho de Palmares, lutando com as armas da justi?a, da verdade, da repara??o, da educa??o, da quebra de preconceitos, do perd?o, do amor, da supera??o das barreiras e do fosso social que ainda separam negros e brancos. Nesta luta vale tudo, menos a viol?ncia e o ?dio e o acomodar-se ao status quo negando as coisas belas, puras e verdadeiras de nossa heran?a africana que devem ocupar nosso pensar e viver.
Vinte de novembro ? data que convida ? reflex?o, comunh?o e a??o. Ela convida a todos os descendentes dos povos que formam os diversos matizes da gente brasileira. Ela nos desafia a movidos pelo amor de Deus, cujo Filho declarou: Eu vim para que todos tenham vida, e que a tenha em plenitude, (Jo 10.10) a impelidos pela for?a do Esp?rito Santo trabalhar pela justi?a e pela paz.
Jos? do Carmo da Silva (Z? do Egito) ? afro-descendente, pastor metodista bacharel
Bibliografia consultada.
CNBB. Ouvi o clamor deste povo. Campanha da Fraternidade 1988, texto – base. Editora Gr?fica Ipiranga LTDA.
TREVISAN, Leonardo. Aboli??o, um suave jogo pol?tico? Editora Moderna . S?o Paulo, 1988.
www1.folha.uol.com.br/folha/…/ult91u401394.shtml

