"O amor tudo espera,tudo suporta" I Co.13.7b
Aconteceu no aeroporto de Guarulhos. Estava esperando o hor?rio do v?o que me levaria a Porto Alegre, na semana anterior ao carnaval. Havia chegado muito cedo. Tomei um caf?. Conversei amenidades com uma senhora. Andei pelo aeroporto, acompanhando o vai e vem t?pico de uma v?spera de feriado.
Enquanto caminhava, passei em frente ao port?o de embarque internacional. Ali estavam postados dois homens que, por diversos motivos, me fizeram concluir que eram pai e filho. O filho iria viajar, considerei ao ver que portava uma mala de m?o. Parei minha caminhada. Por identifica??o com o momento fiquei por ali, dissimulando minha observa??o. Ambos sorriam enquanto falavam. No entanto, lentamente o sorriso deu lugar a uma certa tens?o na face dos dois: chegara a hora da despedida, o filho precisava embarcar. Foi neste momento que eles se abra?aram. Mas n?o foi um abra?o normal, corriqueiro, tranq?ilo. Foi um abra?o intenso, daqueles que misturam num instante o carinho e a dor. Envolveram-se como se quisessem um ao outro prender junto a si. Um sil?ncio envolveu-os, a despeito do entorno. Desabra?aram-se. Fitaram-se com a mesma intensidade do abra?o. Continuaram calados. Era como se pai e filho estivessem gravando na ?ris a imagem um do outro. Estavam nitidamente ? flor da pele. Mais um abra?o, desta vez curto. Balbuciaram algo. O jovem virou as costas e ingressou no sal?o, sem olhar para traz. Estranhamente o pai ficou ali, paralisado, como quem aguarda um improv?vel regresso. Posicionou-se de maneira que pudesse, quem sabe, ter uma vis?o derradeira do filho. Imposs?vel. Esperou mais alguns instantes junto ao port?o, carregando um olhar perdido. Em seguida partiu. Percebi-me emocionado, compadecido, quase triste. Enquanto procurava o meu pr?prio port?o de embarque pensei: est?o certos aqueles que dizem que aeroportos podem significar alegria e pranto. Aqueles dois verteram sem chorar.
Ironia da exist?ncia, escrevo estas linha de dentro do v?o que agora me traz de volta de Porto Alegre. Sim, acabo de ingressar num port?o de embarque, deixando para traz pai, m?e, irm? e av?. A vida se repete. H? instantes passei pelo mesmo ritual que testemunhara dias atr?s em Guarulhos.
Me pego refletindo sobre as aus?ncias que a vida nos imp?e. Penso na fam?lia distante. No rosto de cada familiar. E no mesmo instante que medito sobre o poder avassalador da aus?ncia, percebo que s? tem saudade quem d? significado ? presen?a, quem se abre ao afeto, quem sabe dar boas risadas e valorizar a b?n??o de estar vivo. A saudade apresenta-se como produto do carinho compartilhado, que uma vez puro "tudo suporta", sobrevivendo at? mesmo aos "port?es de embarque" da vida.
Neste momento de saudade, ainda no ar, posso testemunhar que experimento o abra?o de Deus. E este tamb?m n?o ? um abra?o normal, corriqueiro ou tranq?ilo. ? um abra?o completo, pleno de for?a e de alento. Sem problema algum confesso meu cora??o partido, mas estou em paz. Junto ao peito de Deus tenho a seguran?a de que Aquele que me abra?a envolver? os que me amam, dispensando a eles a serenidade que experimento agora. Junto ao peito de Deus quase posso ouvir uma voz dizendo: nenhum port?o de embarque te distancia daqueles que est?o sempre dentro de ti.
Bom seria compartilhar estes sentimentos com os personagens iniciais desta hist?ria. N?o ? poss?vel. Mas posso rogar ao Senhor que o Seu abra?o os alcance. Assim o fa?o.
De certa forma os eventos vividos em aeroportos nestes ?ltimos dias me fizeram entender melhor o quanto o pr?prio Deus nos quer perto de Si. Ao mesmo tempo que nos encoraja a lan?ar-nos na dire??o dos desafios, Ele tamb?m n?o parte. Ele nos abra?a, fita nossas faces e fica, velando de perto nossas entradas e sa?das, nossos embarques e desembarques.
Rev. Jonatas Rotter Cavalheiro
