Ética ou controle


?tica ou controle



Pesquisa do Ibope revela que brasileiro ? conivente com a corrup??o



Marcelo Medeiros



Mensal?o, favorecimento de amigos, absolvi??o de culpados. Esses s?o apenas alguns dos males que aparecem na pol?tica nacional, com velhos ou novos nomes, de tempos em tempos. Desde a redemocratiza??o, a partir de quando tornou-se poss?vel falar livremente sobre o assunto, o pa?s parece viver uma crise pol?tica sem fim.



Especialistas dizem que isso ? reflexo do comportamento da pr?pria popula??o, tolerante com a corrup??o n?o s? dos governantes, mas tamb?m com a que ela mesma pratica. Ao mesmo tempo, afirmam que o cidad?o estaria, na verdade, confuso diante do atual quadro pol?tico. O resultado disso ? a baixa confian?a nas institui?es e na pol?tica como ela ? feita atualmente.



Pesquisa apresentada pelo Instituto Brasileiro de Opini?o P?blica e Estat?stica (Ibope) no 2? Congresso Brasileiro de Pesquisa, realizado em mar?o, revelou um quadro preocupante. O estudo “Corrup??o na pol?tica: eleitor v?tima ou c?mplice?” mostra que o brasileiro ? conivente com a corrup??o, apesar de tanto reclamar dos atos do governo. A toler?ncia poderia ser justificada por outra verifica??o da pesquisa: os brasileiros tamb?m praticam atos il?citos em quantidade e declaram estar propensos a fazer o mesmo se ocupassem cargos p?blicos.



O instituto questionou os entrevistados em rela??o ao seu comportamento caso fizessem parte do Legislativo ou do Executivo. Setenta e cinco por cento afirmaram que cometeriam algum deslize ?tico se estivessem no poder. Entre eles, contratar pessoas e empresas de familiares sem concurso ou licita??o; pagar despesas pessoais com dinheiro p?blico; aproveitar viagens oficiais para lazer pr?prio e de familiares; trocar o voto por um cargo para si, um parente ou um amigo e at? fazer caixa 2 para garantir vit?ria na elei??o.



A pesquisa tamb?m quis saber se os eleitores j? transgrediram alguma lei ou descumpriram alguma regra contratual para obter benef?cios materiais, e 69% disseram que sim. O Ibope perguntou ainda aos entrevistados se eles cometeriam ao menos um de 13 hipot?ticos – embora corriqueiros – atos de corrup??o. Entre as infra?es listadas figuravam: oferecer suborno para escapar de puni??o, sonegar impostos, falsificar documentos, fraudar seguros e comprar produtos roubados.



A maioria dos entrevistados, os tais 69%, declarou que cometeria ao menos um dos 13 atos se tivesse oportunidade e 98% disseram conhecer algu?m que os fa?a. A compra de produtos piratas lidera a lista de crimes: 55% disseram que poderiam adquirir um. O segundo item mais apontado, com 14% de indica?es, foi o ato de "dar caixinha ou gorjeta para se livrar de multa”.



Os n?meros subiram bem mais quando os entrevistados responderam sobre o conhecimento de alguma pessoa que tivesse praticado qualquer uma das duas irregularidades acima. Os ?ndices pulam para 70% e 44%, respectivamente. O aumento ? justificado pelo maior conforto dos respondestes em falar de outros em vez de si mesmos.



Mesmo assim, 64% dos 2001 entrevistados acreditam que o brasileiro ? honesto e 72% consideram "grave e inaceit?vel" dar "caixinha" para se livrar de multa. Por outro lado, 82% dizem que a classe pol?tica destoa dos brasileiros, pois a considera desonesta. O n?mero refor?a os resultados de uma outra pesquisa, feita anualmente por outro instituto, o Gallup, sobre confian?a nas institui?es. No ano passado, apenas 11% dos brasileiros disseram confiar em partidos pol?ticos e 18%, no Congresso Nacional. Os n?meros do Ibope tamb?m revelam a desesperan?a do brasileiro em rela??o ? pol?tica. Para 56% das pessoas, nada vai mudar depois de tantas CPIs e processos. A metade, 28%, acredita que a situa??o vai melhorar.



Para os pesquisadores do instituto, os resultados da pesquisa mostram que o brasileiro ? condescendente com a corrup??o. "Partimos da hip?tese de que a maioria dos brasileiros j? havia descumprido a lei ou burlado um contrato conscientemente e a confirmamos", diz M?rcia Cavallari, diretora-executiva do Ibope Opini?o. Ela conta que a id?ia de fazer esse levantamento veio de outros trabalhos realizados pelo instituto, cujos resultados apontavam nessa dire??o. Cavallari afirma n?o ter ficado surpresa com a conclus?o da pesquisa sobre corrup??o, justamente por causa das anteriores. "H? muito tempo t?nhamos essa impress?o de que, al?m de praticar atos ilegais, tamb?m o far?amos se estiv?ssemos no poder".



No entanto, h? quem acredite que os n?meros podem ser lidos de outra forma. "Discordo da interpreta??o do Ibope", afirma o jornalista Cl?udio Weber Abramo, diretor da ONG Transpar?ncia Brasil, voltada para o combate ? corrup??o no pa?s. "Atos diferentes n?o podem ser examinados da mesma maneira". Para Abramo, os 13 atos listados na pesquisa t?m variados n?veis de gravidade e, al?m disso, algumas respostas podem levar a diferentes conclus?es. "A conclus?o a que o Ibope chegou ? f?cil demais e as respostas s?o amb?guas justamente porque essas situa?es n?o s?o assim, ?preto-no-branco?", diz. Um dos exemplos se refere ao fato do brasileiro se declarar honesto ao mesmo tempo em que afirma estar propenso a cometer atos il?citos.



O jornalista acredita que os brasileiros s?o confusos em rela??o ao que ? um crime grave ou n?o, conclus?o a que chegou tamb?m a diretora-executiva do Ibope Opini?o. "N?o se percebe se um ato ? ?tico ou n?o, o que produz um paradoxo", ela explica. "Ao mesmo tempo em que se cobra comportamento correto de governantes, esses procedimentos n?o s?o adotados no dia-a-dia. De outras pesquisas tira-se que o brasileiro pensa que ?se a situa??o geral ? injusta, n?o h? nada demais em praticar um ato desonesto?. ? o velho argumento de que ?se todos fazem, por que eu n?o posso fazer??".



A Transpar?ncia Brasil faz pesquisas sobre compra de votos em todas as elei?es. Ao mesmo tempo, pergunta sobre a satisfa??o dos eleitores em rela??o aos ent?o governantes. A ?ltima coleta de dados, feita em 2004, mostra que boa parte daqueles que acreditam em atos il?citos cometidos pelo Executivo cr?e, ao mesmo tempo, ter havido um bom governo. E 49% dos que acham que o governo seguinte roubar? tamb?m afirmam vislumbrar um bom governo. "Ou seja, parte dos eleitores convive com a id?ia de ?rouba-mas-faz?, por?m a maioria acredita que o bom governo n?o rouba".



Juventude



Diante desses dados, vale perguntar tamb?m como fica o futuro do pa?s. A mesma pesquisa da TB mostra que dentre os brasileiros que disseram ter sido assediados para vender seu voto (9% do eleitorado), a faixa et?ria mais presente ? justamente a dos jovens. Para Abramo, a descren?a da juventude na pol?tica ? um fen?meno mundial, mas pouco se pode aferir dos dados de sua institui??o, pois n?o houve um m?dulo qualitativo. Os dados do Ibope afirmam que jovens aceitam mais a corrup??o do que as pessoas mais velhas.



Desesperan?a? Talvez n?o. Outra pesquisa, esta feita pelo Ibase em parceria com o Instituto P?lis, aborda o envolvimento dos jovens com a pol?tica. O estudo partiu do princ?pio de que pol?tica n?o se faz apenas por meio de vota?es e envolvimento com partidos, mas tamb?m pela participa??o em grupos culturais, associa?es comunit?rias etc. Os dados coletados com mais de oito mil pessoas de 15 a 24 anos moradoras de regi?es metropolitanas mostram que 28% delas est?o engajadas em algum grupo e 80% dizem se interessar pela pol?tica tradicional.



A pesquisadora do Ibase Patr?cia Lanes afirma n?o ser poss?vel afirmar se esses ?ndices s?o altos ou baixos, pois n?o h? um outro estudo semelhante em qualquer outra ?poca. "H? sim uma idealiza??o em rela??o aos ano 60, mas ningu?m sabe realmente quem participava. Havia um envolvimento da classe m?dia, sim, mas e o resto?", pergunta.



Para ela, ? preciso olhar as raz?es pelas quais o jovem n?o participa ainda mais da pol?tica. Entre os motivos apontados pelos entrevistados na parte qualitativa do estudo sobre esse n?o-envolvimento estavam problemas objetivos do jovem de hoje. Muitos enfrentam dupla jornada (escola e trabalho) e ainda h? falta de incentivo nas escolas para que a juventude se torne ainda mais ativa. "N?o existe uma cultura pr?via de participa??o em v?rias inst?ncias da vida jovem", lamenta Lanes.



Por outro lado, os jovens n?o s?o desesperan?osos em rela??o ? pol?tica, apenas cr?ticos. Quando uma possibilidade de participa??o lhes ? apresentada, surge interesse. "Eles acreditam na pol?tica como forma de mudan?a. O descr?dito est? nos pol?ticos, n?o na pol?tica", diz.
A confian?a nos pol?ticos, para Abramo, ser? verificada nas pr?ximas elei?es. "? preciso estar atento para a taxa de renova??o da C?mara", diz. Em 2002, pouco mais da metade dos deputados era novata em Bras?lia. "A expectativa ? que este ano a renova??o seja ainda maior, e isso, por um lado, ? ruim, por causa da inexperi?ncia dos novos representantes. ? o aumento do ?baixo clero?", critica, referindo-se aos deputados de menor express?o.



Reformas



A quest?o, no entanto, vai al?m. Se deputados e senadores, al?m dos governantes, n?o desempenham corretamente suas fun?es, n?o deveriam ser punidos? Para o presidente da Comiss?o de Defesa da Rep?blica e da Democracia do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), F?bio Konder Comparato, sim. Em palestra no 1? Ato P?blico em Defesa da Cidadania e da Democracia, organizado por diversas entidades locais de Ponta Grossa (PR), o jurista declarou apoio ? Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que possibilita a substitui??o de parlamentares e membros do Executivo no meio do mandato. "O povo precisa ter mecanismos para responsabilizar os poderes p?blicos", defende.



Comparato acredita, por?m, que para a PEC ser bem sucedida ser? preciso haver uma mudan?a na mentalidade da popula??o. "Essa proposta exige uma educa??o c?vica e uma mudan?a de mentalidade na nossa ?tica, no nosso trato com a vida p?blica. ? um trabalho longo que precisa ser come?ado, a fim de que a sociedade civil se organize e fa?a press?o sobre os poderes p?blicos. Somente com press?o popular h? avan?os. Hoje os partidos trabalham para exercer o poder, quando na verdade eles devem funcionar como auxiliares do povo", afirmou.



Para Abramo, as mudan?as precisam ir al?m. Segundo o jornalista n?o adianta apenas reformar institui?es, ? necess?rio tamb?m realizar um trabalho de preven??o e de aumento de efici?ncia do Estado. "Corrup??o ? retrato da inefici?ncia. A quest?o n?o ? falar apenas em ?tica no Brasil, pois corruptos existem em todos os lugares do mundo. O problema ? o que lhes permite agir dessa forma", critica. O diretor da Transpar?ncia Brasil diz ser preciso “apertar” as normas e intensificar as a?es preventivas. Como exemplo de como isso pode funcionar, cita a altera??o de fun?es da Corregedoria Geral da Uni?o. Antes, ela era respons?vel somente pela fiscaliza??o das a?es do Estado, mas desde o fim do ano passado tamb?m ? encarregada de tra?ar planos de preven??o de m?s a?es. "Combatemos a crise ?tica n?o atrav?s da perspectiva moral, mas das regras", conclui Abramo.

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