![]() | Livro da profa Magali Cunha, da Faculdade de Teologia da Umesp, ganha destaque em caderno de cultura do jornal Folha de S.Paulo |
Mat?ria publicada na Folha de S.Paulo, 10/02/2008
Sons dessacralizados
“A Explos?o Gospel” analisa como o g?nero mudou o protestantismo, e “M?sica e Simboliza??o” enfoca o mangue beat
LIVIO TRAGTENBERG
ESPECIAL PARA A FOLHA
O lan?amento dos livros “A Explos?o Gospel”, de Magali do Nascimento Cunha, e “M?sica e Simboliza??o”, de Rejane S? Markman, mostra a diversidade na abordagem dos estudos da cultura contempor?nea. O primeiro, informativo e cr?tico, e o segundo, acad?mico, no sentido mais est?ril do termo.
N?o consigo entender por que a universidade mant?m certas f?rmas para as teses universit?rias, que se repetem ? exaust?o, num tipo de formula??o que muitas das vezes serve para desconversar sobre o tema, criando uma casca te?rica que preenche o espa?o das id?ias originais.
Desse marasmo convencional e acad?mico escapa o livro “A Explos?o Gospel”. A autora, membro da Igreja Metodista e pesquisadora, tra?a um elucidativo painel das transforma?es por que passou o universo do protestantismo no Brasil desde sua implementa??o por mission?rios norte-americanos no s?culo 19.
Conclui que, al?m da m?sica, uma nova forma de relacionamento entre igreja e sociedade, a cria??o de um mercado pr?prio de consumo, resultou num novo modo de viver do protestante, que “resulta numa moderniza??o de superf?cie”.
Uma relativiza??o da “?tica protestante”, j? estudada pelo soci?logo alem?o Max Weber, que nesse novo contexto redimensiona “a santidade puritana de repress?o do corpo e valoriza a express?o corporal tanto no culto quanto nos espa?os de lazer e entretenimento criados para os evang?licos”.
Ao contr?rio da Igreja Cat?lica, os protestantes, de forma geral, agregaram a tecnologia da comunica??o -a “espetaculariza??o da f?”- buscando a ocupa??o de espa?os na televis?o, no r?dio e no mercado fonogr?fico: “N?o h? mais culto em igrejas protestantes sem eletr?nica, e n?o h? mais devo??o pessoal sem a m?dia”, segundo a autora.
? interessante notar que esse movimento remonta aos anos 1950. J? nos anos 70, era comum encontrar grupos de jovens, com um visual hippie, entrando nos ?nibus das grandes cidades brasileiras entoando can?es protestantes; eram “os meninos de Deus”.
Esse percurso ? tratado de forma detalhada at? a nova gera??o dos cantores gospel, que inclui uma ampla fauna, desde Mara Maravilha a Baby do Brasil -que fundou sua pr?pria igreja- at? os DJs de Cristo e os “adoradores”, uma forma h?brida de m?sico e pastor.
Um pequeno exemplo desse movimento em dire??o ? sociedade foi minha classe de composi??o na Universidade Estadual de Campinas (SP) nos anos 90, composta em quase sua totalidade por estudantes evang?licos, bancados por suas igrejas para que, depois de formados, nelas trabalhassem.
O livro identifica tamb?m uma “postura de superioridade cultural dos mission?rios protestantes estadunidenses”, que rejeitaram incorporar a cultura popular brasileira -assim como fizera Lutero em rela??o ? cultura alem?-, para concluir que todo esse movimento preserva ponto b?sicos do conservadorismo protestante: os dualismos igreja/mundo e sagrado/profano e o sectarismo, o antiecumenismo, o clericalismo e o antiintelectualismo.
“A Explos?o Gospel” ? um livro essencial para entender o fen?meno dos evang?licos, suas estrat?gias e formas de relacionamento com o mundo de hoje. Um exemplo de pesquisa que n?o patinou no limbo do academicismo.
Contraponto
J? “M?sica e Simboliza??o” aborda o movimento musical mangue beat como fen?meno de contracultura. Originalmente uma tese de doutorado, sofre dos v?cios da metodologia -t?o valorizada na academia, mas que, sem o concurso de id?ias originais, esgota-se num discurso fechado sobre si mesmo.
O livro nos conduz por explana?es contextuais para cada novo t?pico abordado. Conceitua?es retrospectivas nos remetem sucessivamente ? Idade da Pedra de cada tema. Apenas o ?ltimo ter?o do livro aborda diretamente o universo do mangue beat.
Ap?s esse p?riplo contextual, somos informados de que o mangue beat foi recha?ado pelo conservadorismo local dos “folcloristas” e de intelectuais ligados ao Movimento Armorial e que suas m?sicas, al?m de incorporarem ritmos populares como o maracatu e os caboclinhos, entre outros, fazem uso de express?es idiom?ticas populares e apontam para a critica social.
Ora, isso j? est? explicitado nas pr?prias composi?es. A quest?o ? que ?s vezes as obriga?es da metodologia ocupam o espa?o do pr?prio aprofundamento do tema.
Ao final da leitura, complementada por mapas e tabelas que nada acrescentam de substancial, nos damos conta de que o tema tanto poderia ser o mangue beat quanto a evolu??o do cultivo da cana-de-a?car…
Uma vez que a f?rma do discurso prevalece. S?o as mazelas da academia e de certa metodologia que serve mais para esconder o objeto.
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LIVIO TRAGTENBERG ? compositor e diretor musical da Orquestra de M?sicos das Ruas de S?o Paulo.
A EXPLOS?O GOSPEL
Autor: Magali do Nascimento Cunha
Editora: Mauad (tel. 0/xx/21/3479-7422)
Quanto: R$ 38 (232 p?gs.)
M?SICA E SIMBOLIZA??O
Autor: Rejane S? Markman
Editora: Annablume (tel. 0/xx/11/ 3031-9727)
Quanto: R$ 30 (232 p?gs.)
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