Impressões de um católico sobre Concílio Metodista

Por: Magali do Nascimento Cunha


Na semana passada participei de um semin?rio ecum?nico em que o tema de destaque em todas as conversas – no programa e nos momentos informais – acabou sendo a decis?o de nossa Igreja Metodista de se desligar de qualquer associa??o oficial da qual a Igreja Cat?lica Romana fa?a parte. Tive que responder a muitas perguntas. O mesmo aconteceu com outros/as metodistas presentes.


Um dos conferencistas era o Padre Jos? Oscar Beozzo, secret?rio-executivo do Centro Ecum?nico de Servi?os ? Evangeliza??o e ? Educa??o Popular. O tema da apresenta??o dele era "Quest?es atuais do ecumenismo e do di?logo inter-religioso na Am?rica Latina". Ele foi o representante da Igreja Cat?lica Romana (CNBB) no ?ltimo Conc?lio Geral da Igreja Metodista e participou integralmente de todas as sess?es.


Claro que ele n?o poderia deixar de dizer alguma coisa sobre o Conc?lio Geral Afinal, havia o tema de sua fala + o tema de destaque em todas as conversas + a informa??o socializada de que ele esteve presente e viveu tudo o que foi vivido em Aracruz.


Gostei muito da fala dele. Avalio como uma atitude de humildade da qual n?s, metodistas brasileiros, precisamos muito nestes tempos em que vivemos. Ele dividiu a reflex?o em quatro momentos, o que passo a compartilhar com quem ler esta mensagem.


Primeiro: Aprendizado no Conc?lio


Ele relatou tudo o que aprendeu, sendo participante do conc?lio, onde esteve pela primeira vez. Falou de como foi bem acolhido, como se sentiu em casa – mesmo sendo o ?nico padre cat?lico-romano entre mais de 200 metodistas – disse: "n?o vi nenhum problema em rela??o ? minha pessoa".


Ele destacou tamb?m a transpar?ncia dos/as dirigentes da igreja, aliada ? confian?a que foi depositada nele e nos demais representantes de outras igrejas e organismos que receberam todo o material distribu?do em conc?lio. Documentos, os mais diversos, chegaram ?s suas m?os, sem discrimina??o.


O padre Beozzo revelou que aprendeu muito pelo conc?lio ser um conc?lio de ora??o. Ele percebeu que a ora??o esteve presente ao longo de todo o evento. Na avalia??o dele, geralmente, o mais comum ? se ter momentos espec?ficos de ora??o mas, palavras dele, "o cora??o aquecido metodista" se manifestou com uma presen?a constante da ora??o em diversos momentos – parava-se sess?es para orar. Houve tamb?m o momento do jejum durante a elei??o dos bispos e da bispa e um cantinho de ora??o permanente. O padre Beozzo aprendeu que h? coragem nesta pr?tica.


Outro elemento que lhe serviu de aprendizado foi o fato de que a caminhada da Igreja n?o ? monopolizada por seu Col?gio Episcopal ("o que ? muito comum na Igreja Cat?lica", disse Beozzo). Ele destacou: "a voz dos batizados, dos membros do corpo – homens, mulheres, pastores, pastoras, leigos, leigas – era ouvida". O minist?rio feminino tem um lugar significativo na Igreja Metodista, na vis?o do padre cat?lico, que acrescentou: "por isso a Igreja Metodista saiu na frente na abertura para o minist?rio feminino no Brasil e ? a ?nica das chamadas igrejas hist?ricas a ter uma bispa. Ela foi reeleita no ?ltimo escrut?nio – mas foi reeleita!".


Impressionou ainda o padre Beozzo o fato de a Igreja Metodista ter uma "c?mara jur?dica" (a Comiss?o Geral de Justi?a), com gente com forma??o em Direito para a qual se pode recorrer e apelar.


Segundo: Pedido de perd?o


No segundo momento de sua fala, o padre Beozzo expressou um pedido de perd?o por sua Igreja aos irm?os e irm?s metodistas presentes. Ele disse que se a Igreja Metodista quer se distanciar da Igreja Cat?lica Romana ? porque muitas coisas que esta igreja faz e fala provocam o afastamento das igrejas irm?s. Ele destacou que a Igreja Cat?lica Romana, ao contr?rio do que muita gente pensa e fala, ficou muito tempo de fora da caminhada ecum?nica na Am?rica Latina.


Desde a Confer?ncia do Panam? em 1916, houve esfor?os de aproxima??o da parte dos evang?licos mas a Igreja Cat?lica esteve ausente e recusou contato. Estar tanto tempo fora da caminhada, ? elemento negativo no processo, diferente dos metodistas, que sempre estiveram entre os primeiros a se engajarem.


Beozzo declarou que sua igreja tem muito o que aprender com a caminhada ecum?nica. Somente com Jo?o XXIII e o Vaticano II ? que a busca de unidade aflorou, o que ? uma decis?o muito recente. Apenas em 1965 a Igreja Cat?lica no Brasil afirmou que ecumenismo seria uma das seis prioridades de a??o no pa?s.


Por isso, ele apresentou tr?s motivos especiais para pedir perd?o aos metodistas:


1 – Soberba. A Igreja Cat?lica Romana ainda ? a maior igreja do mundo, agrupando 52% de todos os crist?os do planeta. Para Beozzo, ? como "um elefante num jardim" – acaba esmagando as menores – n?o as ouve antes de tomar decis?es que afetam todos os crist?os. ? uma atitude de soberba.


2 – Posi?es Teol?gicas. Cat?licos Romanos ainda dizem que h? apenas uma igreja e que Jesus Cristo n?o fundou v?rias igrejas. Uma das afirma?es hist?ricas, decorrentes do Vaticano II, ?: "A Igreja de Cristo subsiste nas igrejas".O problema, segundo Beozzo, ? que a Declara??o Dominus Iesus trocou a express?o "subsiste nas" por "e as". Por isso, afirmou, a Dominus Iesus ? atrapalha a caminhada ecum?nica crist? pois ela deveria ter tratado apenas da quest?o do di?logo inter-religioso e acabou retomando afirma?es anteriores ao Vaticano II.


3 – Eucaristia. O ?ltimo documento sobre Eucaristia volta atr?s nas ?nfases do Vaticano II, pois afirma que n?o se partilha a comunh?o do corpo e do sangue com as igrejas com quem n?o se tem comunh?o.


Estes s?o tr?s elementos destacados, segundo o padre Beozzo, dentre outros que t?m causado sofrimento e dificuldades a outras igrejas, n?o s? ? Metodista. Por isso ele pediu perd?o em viva voz.


Terceiro: impress?es sobre a discuss?o do tema "ecumenismo"


No terceiro momento de sua apresenta??o, Jos? Oscar Beozzo pediu licen?a a n?s, metodistas presentes, para partilhar algumas id?ias decorrentes do impacto que lhe causou as falas no momento da discuss?o em plen?rio sobre o tema "ecumenismo".


1 – ele constatou que existem dificuldades na Igreja em rela??o ao tema e n?o se pode "tampar o sol com a peneira", atribuindo-lhe car?ter pol?tico ou jur?dico t?o s?;


2 – houve um problema de m?todo na apresenta??o do tema. N?o houve di?logo. N?o houve momento pedag?gico de se suspender o debate, por vezes por demais acalorado, para se ouvir quem n?o teve chance de falar, conversar em grupos, por exemplo. Para Beozzo ficou claro que os discursos j? estavam prontos e eram simplesmente apresentados, sem qualquer expectativa de altera??o ou abertura para ouvir.


3 – Ficou n?tida para o participante cat?lico a exist?ncia de um problema pastoral. Houve momentos em que se ouviu "bispo, me ajude. O que fazer?" ou "est?o saindo pessoas da igreja!".


Para o padre Beozzo n?o ? s? o caso de estar saindo gente da igreja que deveria dirigir a discuss?o mas a pergunta: o que est? fazendo gente sofrer nas igrejas? Esta pergunta n?o foi feita. Dizia-se muito das divis?es, das sa?das, mas, o padre Beozzo n?o ouviu ningu?m perguntar "por que?", por que as pessoas sofrem a ponto de sair? Por que as pessoas saem das comunidades? O problema pastoral se revela pela falta da pergunta e da resposta ao porqu?. E isto se intensificava com as falas de pastores anotadas por Jos? Oscar Beozzo: "Bispo, o que eu fa?o com esta situa??o?" Beozzo anotou a seguinte cr?tica em algumas falas: "voc?s, que est?o nas universidades, fora das comunidades locais, n?o v?em as dificuldades com o ecumenismo.


Quem v? ? quem est? na base, na comunidade local". Por que esta afirma??o foi feita? Mais um ind?cio do problema pastoral, para o representante cat?lico no conc?lio. "No ch?o pastoral", afirmou, "h? que se ter aproxima??o pastoral e n?o doutrinal t?o s?".


4 – As reclama?es sobre a Igreja Cat?lica Romana que apareceram nas falas dos conciliares metodistas foram de tr?s tipos:


a) repetiu-se o que aparece na m?dia cat?lica como a verdade sobre o catolicismo no Brasil. Isto confirmou que mais vale o que o padre Marcelo Rossi fala do que o que a CNBB fala. Isto, para padre Beozzo ? um problema porque as redes de TV cat?licas n?o t?m postura ecum?nica e quando as pessoas s? conhecem o que estas redes divulgam, fica muito dif?cil de lidar com a quest?o. Quem tem abertura para o di?logo e caminhada ecum?nica, raramente tem destaque na m?dia cat?lica;


b) houve a reclama??o de mau trato das lideran?as cat?licas na base para com os evang?licos: "chamam a gente de seita!". Beozzo reconhece a cr?tica como real, mas ? preciso reconhecer tamb?m, para ele, que isso ? fruto da falta de contato, de freq??ncia de encontro, de di?logo nas localidades;


c) houve reclama?es de ordem doutrinal, como cita?es do Documento Dominus Iesus. A reclama??o deve ser acolhida, diz Beozzo, mas n?o se resolve sem uma parada para pensar e dialogar com quem tem a mesma reclama??o entre os cat?licos.


Quarto: O que fazer?


O padre Jos? Oscar Beozzo terminou sua exposi??o indicando algumas quest?es pr?ticas para a considera??o dos presentes no semin?rio, que estendo ? considera??o de quem l? esta mensagem.


1 – o quanto revisamos nossos materiais de estudo com nossas bases para que tenham a dimens?o ecum?nica ressaltada?


2 – o quanto temos investido na forma??o ecum?nica?


3 – quanto dos semin?rios teol?gicos inserem nas disciplinas do curr?culo a dimens?o ecum?nica?


4 – N?o podemos desconhecer as quatro grandes tradi?es crist?s, do ponto de vista teol?gico, pastoral e lit?rgico: a tradi??o oriental, a cat?lica romana, a protestante e a pentecostal. Isto ? urgente.


5 – Voltar nossa aten??o principalmente ? B?blia e n?o s? ao que dizem os patriarcas de cada confiss?o como Aquino, Lutero ou Wesley, dentre outros. Beozzo diz que ouviu mais sobre Wesley nas falas do conc?lio e pouco sobre a B?blia. N?o seria necess?rio voltar ? B?blia, que ? o que nos une?


6 – ? preciso trabalhar mais a espiritualidade ecum?nica. Precisamos de espa?o para realimentarmos nosso compromisso ecum?nico. Nos momentos de ora??o a gente se encontra…


7 – Exercitar o convite para participa??o nos momentos lit?rgicos, celebrativos e romper preconceitos. Ter uma acolhida fraterna nas celebra?es… conhecer como celebram as diferentes tradi?es, por meio de visita fraterna.


8 – Na Am?rica Latina o compromisso ecum?nico se renova nas lutas concretas por justi?a e paz e a ora??o vai junto. Reafirmar e viver mais intensamente isto.


Ent?o…


Eu me emocionei muito com a fala do padre Beozzo. Aprendi com sua humildade e sua espiritualidade e com sua postura aberta e desarmada. Suas impress?es, algumas cr?ticas, me ensinam muito. Concordo muito com a vis?o de que temos um problema pastoral. ? verdade!


Quando vamos enfrent?-lo? Acredito que n?o ? com vota??o ou legisla??o que trabalharemos a cura de feridas abertas que t?m a ver com a quest?o ecum?nica e ao mesmo tempo n?o!
Expliquei ao padre Beozzo, que diferente da fala de senso comum que ele anotou, estou na universidade e estou radicalmente integrada ? base, ? comunidade local – nunca deixei de s?-lo como leiga; at? o ano passado eu era professora da escola dominical e agora sou aluna da classe de adultos. Estou na igreja local, e, por isso vejo, sim, as dificuldades com o ecumenismo.


Dificuldades que nascem da intoler?ncia e da falta de amor que muitas vezes s?o ensinadas e propagadas por meio de estudos, prega?es e can?es da moda.


Aprendi muito com o padre Beozzo, ao ouvi-lo falar na semana passada. Preciso aprender mais com pessoas como ele a ter humildade e fraternidade em momentos como o que ele experimentou. Assim a gente vai vendo e vivendo a a??o de Deus.


Magali do Nascimento Cunha
Publicado no site
http://www.metodistaecumenico.blogspot.com/



Convidados ao 18? Conc?lio Geral da Igreja Metodista: da esquerda para a direita, Rev. Rolf Sch?nemann, pastor sinodal da Igreja Evang?lica de Confiss?o Luterana do Brasil; D.Jubal Neves, bispo da Igreja Anglicana do Brasil; e Pe. Jos? Oscar Beozzo, da Igreja Cat?lica, coordenador do CESEP, Centro Ecum?nico de Servi?os ? Evangeliza??o e Educa??o Popular. 

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