Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 20/09/2013

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Fui em busca desse livro na livraria de um conhecido meu. Felizmente comecei casualmente com a primeira carta de São João e ali encontrei a definição de Deus: "Deus é amor". E mais tarde, procurando mais detidamente, encontrei o carpinteiro Jesus, encarnação desse amor em seu trato com o ser humano.

 

Apesar de ter sido criado por uma avó muito religiosa, o jovem Sante Uberto Barbieri nunca havia lido a Bíblia. Seus pais, militantes anarquistas, transmitiram ao filho os ideais políticos de justiça social e liberdade, mas viam a religião com desconfiança. No entanto, desse encontro do jovem anarquista com o "carpinteiro Jesus" nasceria um dos bispos mais importantes da história da Igreja Metodista na América Latina.

 

Quem conta esta história é o Rev. Luis de Souza Cardoso, atual Secretário Executivo do Cogeime - Instituto Metodista de Serviços Educacionais. Em 2001, ele concluiu uma ampla pesquisa que resultou na dissertação de mestrado "Sante Uberto Barbieri: recorte biográfico de um imigrante italiano no Brasil meridional e sua inserção no metodismo". Nessa monografia, que lhe conferiu o título de mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo, o Rev. Luis Cardoso conta a fascinante trajetória de Sante Uberto Barbieri, do nascimento ao período em que esteve no Brasil, até 1939, quando passou a servir no Uruguai e Argentina. 

 

Nascido na Itália, em 1902, Barbieri chegou ao Brasil no ano de 1911. Dez anos depois, numa rua de Passo Fundo, Rio Grande do Sul, ocorreria o incidente que deu novos rumos à sua vida. Era o final de 1921. Voltava para casa quando encontrou na rua um folheto. "Ávido leitor que era, não se furtou em apanhá-lo prontamente, guardando-o no bolso para mais tarde lê-lo com atenção", relata Cardoso. Ao chegar em casa, o jovem se surpreendeu com o conteúdo: era o texto de um sacerdote católico atacando um grupo religioso dissidente que ele desconhecia, denominado metodista. "Sua curiosidade aguçou-se naquele momento, porém mais forte foi sua indignação com o que chamou de ?insulto à dignidade humana´ e uma ?oposição à liberdade de consciência´."  Naquela época, eram freqüentes os ataques religiosos entre católicos e protestantes, explica o Rev. Cardoso. "Barbieri não era religioso, mas fora educado na defesa das causas libertárias. Assim, embora ele não conhecesse os metodistas, sentia que eles tinham o direito de viver e cultuar a Deus a seu modo".

 

Em resposta ao folheto, o rapaz escreveu no jornal de sua cidade um artigo inflamado em defesa da liberdade de expressão dos metodistas. Não demorou para que os próprios metodistas se interessassem em conhecer o seu "defensor". O missionário Daniel Lander Betts convidou Barbieri para assistir a Escola Dominical, à qual ele foi "mais por curiosidade do que por qualquer outro propósito". Foi também por curiosidade que Barbieri buscou ler a Bíblia, e assim começou toda uma vida de fé e dedicação ao trabalho missionário, especialmente na área de educação teológica da Igreja Metodista.

 

Barbieri foi pastor da Igreja Metodista no Brasil de 1926 a 1939. Durante este período, entre 1929 e 1933, estudou nos Estados Unidos e, ao retornar, assumiu a direção da Faculdade de Teologia do Porto Alegre College, vinculada ao Concílio Regional do Sul, posteriormente transferida para Passo Fundo. Também, foi o primeiro reitor da Faculdade de Teologia da Igreja Metodista, criada pelo 3º Concílio Geral, em 1938, por meio da união das faculdades.de teologia existentes no Rio Grande do Sul (Porto Alegre / Passo Fundo) e em Minas Gerais (Juiz de Fora).  Divergências com o Conselho Superior da Faculdade fizeram com que Barbieri tomasse a decisão de se demitir do cargo e, pouco tempo depois, aceitar um convite da Conferência do Rio da Prata (Uruguai e Argentina) para ensinar teologia no Union Theological Seminary, em Buenos Aires, que deu origem ao atual Instituto Universitário ISEDET.

 

Como Bispo da Conferência Central Metodista da América Latina, eleito em 1949, o Rev Sante Uberto Barbieri dirigiu as igrejas da Argentina, Bolívia, Uruguai e Peru. Também em 1949, foi presidente da Primeira CELA - Conferência Evangélica Latino-americana; posteriormente, em 1954, foi eleito presidente do CMI - Conselho Mundial de Igrejas. Na década de 1970, teve atuação fundamental para a fundação do CIEMAL - Conselho de Igrejas Evangélicas Metodistas da América Latina e Caribe, bem como, foi um dos principais articuladores da organização do CLAI - Conselho Latino Americano de Igrejas..

 

Barbieri faleceu em 1991, na Argentina, e nos deixou uma obra literária com mais de oitenta títulos em várias áreas (teologia, poesia, novelas, contos...), além de um indelével exemplo de vida que o Rev. Luis Cardoso registrou detalhadamente em sua pesquisa.


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