violência doméstica mulheres agredidas



Erin N. Marcus

A mulher de cabelos grisalhos me recebeu ? porta da cl?nica, um de seus bra?os suspenso em uma faixa azul brilhante.

Esta n?o era sua primeira visita. Nos meses anteriores, ela havia vindo ? cl?nica duas vezes com dores inexplic?veis. Agora seu marido quebrou seu bra?o, e a raz?o destas visitas se tornou limpidamente ?bvia: ele vinha batendo nela.

E a pergunta sobre viol?ncia dom?stica que eu havia feito alguns meses atr?s – no meio de outras sobre cigarros e cintos de seguran?a – pareceu ter sido espetacularmente ineficaz, j? que a resposta foi “n?o”.

Quando perguntei sobre viol?ncia em casa, seguia orienta?es definidas pelo cirurgi?o-geral e muitos grupos profissionais, incluindo a Associa??o M?dica Americana (American Medical Association). Aqueles que ap?iam os question?rios de rotina dizem que a viol?ncia dom?stica ? t?o ou mais comum entre mulheres do que muitas doen?as checadas regularmente pelos m?dicos, incluindo c?ncer de mama e de c?lon, e seus riscos ? sa?de s?o bem documentados.

Apesar dessas recomenda?es, questionar mulheres aparentemente saud?veis por sinais de abuso dom?stico n?o est? nem perto de ser t?o comum quanto os exames de c?ncer de mama ou colesterol.

Alguns m?dicos enxergam a viol?ncia dom?stica como um assunto da justi?a criminal e sentem-se ultrajados com a expectativa de que deveriam se aprofundar em um t?pico t?o dif?cil, quando j? t?m a responsabilidade de perguntar aos pacientes sobre muitas outras condi?es e diagnosticar doen?as complicadas durante consultas cada vez mais curtas.

Em um estudo recente com quase 5.000 mulheres no mundo inteiro revelou que apenas 7% disseram ter sido questionadas sobre viol?ncia dom?stica ou familiar por um profissional da sa?de. Quando pesquisados, m?dicos freq?entemente respondem que n?o fazem tais perguntas por falta de tempo, treinamento e acesso facilitado a servi?os que ajudariam esses pacientes.

Alguns relataram preocupa??o em ofender os pacientes e acreditam que perguntar n?o far? nenhuma diferen?a.

“Assim como qualquer um, m?dicos evitam situa?es que possam lhes trazer desconforto”, diz o Dr. Michael Rodriguez, pesquisador e m?dico de fam?lia na Universidade da Calif?rnia, em Los Angeles. “Tamb?m h? uma expectativa da parte de alguns que, uma vez identificado o abuso, ela deveria simplesmente deixar o marido. E isso gera uma frustra??o quando ela n?o o faz”.

Rodriguez e outros especialistas dizem que encorajar uma paciente que sofreu abuso a simplesmente ir embora pode n?o ser realista ou seguro, por v?rias raz?es: o risco de ser assassinada ? maior quando algu?m foge, a mulher pode depender de seu parceiro para comida e abrigo, e as pacientes podem n?o reagir bem a um m?dico que d? ordens sobre o que fazer.

Eles tamb?m dizem que a melhor maneira de perguntar sobre tais abusos ? em um lugar privado, sem membros da fam?lia presentes, como parte do hist?rico de rotina da paciente. Se ela diz que foi espancada ou amea?ada em casa, os especialistas recomendam que o m?dico ofere?a empatia, diga a ela que o que est? acontecendo ? errado, documente sua hist?ria na ficha m?dica e forne?a informa?es sobre locais aonde ir ou indic?-la a pessoas que possam ajudar, como um assistente social.

Barbara Gerbert, diretora do Centro para Melhora da Sa?de e Estudos de Preven??o (Center for Health Improvement and Prevention Studies) da Universidade da Calif?rnia, em S?o Francisco, diz que apesar de algumas mulheres negarem a viol?ncia dom?stica a princ?pio, a pergunta em si pode ter um efeito profundo: muitas mulheres lembram que seus m?dicos perguntaram e decidem, anos depois, revelar seu segredo.

“Apenas perguntando, voc? pode plantar uma semente para a mudan?a,” diz ela.

Numerosos estudos, entretanto, indicam que os m?dicos perguntam muito pouco sobre a viol?ncia dom?stica, e n?o lidam muito bem com uma eventual resposta positiva.

Felicia M. Frezell, 34, uma gerente de escrit?rio em Omaha, contou-me recentemente que costumava visitar o consult?rio de seu m?dico regularmente com seus cinco filhos durante os 15 anos em que morou com seu ex-marido, que foi condenado em 2005 por estupr?-la. Ela disse que mesmo tendo marcas e machucados, ningu?m nunca a questionou por que – at? que ela pediu que o m?dico olhasse seu olho inchado e roxo e disse que seu marido havia batido nela.

“Ele apenas disse, '? melhor voc? sair dessa situa??o' e deixou por isso”, diz Frezell, acrescentando: “Olhando para tr?s, eu n?o conhecia os recursos existentes. O consult?rio ? um bom lugar para ir, por ser neutro e confidencial. N?o ? como contar a seu marido que voc? est? indo ? delegacia de pol?cia”.

De acordo com o Bureau de Estat?sticas de Justi?a (Bureau of Justice Statistics), de 2001 a 2005 (o ?ltimo ano com estat?sticas dispon?veis) houve uma m?dia anual de quase 511.000 ataques violentos contra mulheres – e 105.000 contra homens – da parte de c?njuges ou parceiros ?ntimos, com aproximadamente metade deles resultando em seq?elas f?sicas.

Apesar desses n?meros, a US Preventive Services Task Force concluiu em 2004 que, embora os cl?nicos devessem “estar alertas” para sinais de viol?ncia, n?o havia evid?ncias suficientes para ser contra ou a favor do questionamento de pacientes assintom?ticos sobre o abuso dom?stico – principalmente pela car?ncia de estudos cient?ficos de larga escala sobre essa quest?o.

Enquanto muitos pesquisadores pregam a necessidade de mais dinheiro para pagar por tais estudos, alguns dizem que a analogia com o questionamento de rotina perde o foco.

“Tentar comparar isso a um papanicolau ? o paradigma errado, n?o d? certo”, diz a Dra. Christina Nicolaidis, uma residente geral e pesquisadora na Oregon Health and Science University. “N?o ? um teste que voc? pode simplesmente preencher.”

“As raz?es para perguntar”, ela continua, “s?o educar uma paciente e abrir a porta para que ela saiba que pode vir a voc?. ? parte do desenvolvimento de um relacionamento real com seu paciente. Com o tempo, voc? conseguir? revelar o abuso e melhorar a seguran?a dela, al?m de entender melhor por que ela est? tendo seus sintomas e a melhor maneira de abordar o entendimento dela mesma sobre sua situa??o”.

Mulheres v?timas de abuso t?m maiores riscos de dores cr?nicas, depress?o, ansiedade e abuso de ?lcool e subst?ncias, e podem ter dificuldades em tomar seus medicamentos corretamente e atender a consultas. Em estudo recente, mulheres v?timas de abuso no ano passado mostraram-se mais prop?cias a ter parceiros que interferiam com seus cuidados m?dicos.

Sete anos atr?s, o Instituto de Medicina distribuiu um grande relat?rio sobre o treinamento de funcion?rios da Sa?de sobre a viol?ncia familiar. O relat?rio concluiu que tal viol?ncia “n?o era uma prioridade consistente” na educa??o dos funcion?rios e recomendou que o Departamento de Sa?de e Servi?os Humanos estabelecesse centros de educa??o e pesquisa sobre o assunto.

Por uma infeliz coincid?ncia, o relat?rio foi lan?ado em uma confer?ncia de not?cias em 11 de setembro de 2001, e at? agora s? “recolheu p?,” diz um dos autores, Felicia Cohn, que dirige ?tica m?dica na Universidade da Calif?rnia, em Irvine.

“Certamente outros assuntos tiveram maior import?ncia no momento”, acrescentou Cohn, “mas a cont?nua falta de aten??o ? imperdo?vel e preocupante. Esta ? uma pandemia de sa?de p?blica com imensas implica?es no cuidado com a sa?de”.

Para minha paciente dos cabelos grisalhos – e outras mulheres que vejo na cl?nica onde trabalho – n?o houve respostas simples. Eu guardo os n?meros de telefone de um abrigo para mulheres local e da unidade de viol?ncia dom?stica do departamento de pol?cia no bolso do meu jaleco. E continuo fazendo a pergunta, para que meus pacientes saibam que h? um lugar para onde ir.

Tradu??o: The New York News Service

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