Publicado por José Geraldo Magalhães em Geral - 20/09/2013

o que é a vida mayana zatz

 
Por Mayana Zatz *

No último dia 20/4, participei em Brasília de um debate histórico, a convite do Supremo Tribunal Federal (STF). Foi a primeira vez que este assunto extremamente polêmico -- o uso de células embrionárias (CTE) para pesquisas -- era discutido em uma audiência pública. A iniciativa, digna de aplausos, teve por objetivo oferecer subsídios aos ministros do STF para julgar uma ação de inconstitucionalidade (Adin) contra a Lei de Biossegurança, aprovada em 2005, que permite as pesquisas com células-tronco embrionárias. SAIBA O QUE SÃO CÉLULAS TRONCO CLICANDO AQUI.

Os opositores a essas pesquisas defendem a tese de que a vida humana começa no momento da concepção. Portanto, os embriões congelados nas clínicas de fertilização seriam "pessoas" -- que não podem ser destruídos para pesquisas, mesmo que essas possam resultar em futuros tratamentos que poderão salvar inúmeras vidas.

O debate todo ocorreu em torno do tema central: "Quando começa a vida?"

No momento da fertilização? Quando o embrião implanta-se na parede uterina? Quando se forma o sistema nervoso? Quando ele pode viver independentemente da mãe? Quando nasce?

Não existe um consenso. Afinal, cada um de nós tem a sua opinião, de acordo com sua experiência científica, crença ética ou religiosa.

A questão é: o que é vida? Todas as células do nosso corpo estão vivas. Um coração, rim ou fígado, para serem transplantados, têm de estar vivos. Eles não são pessoas, não são seres humanos. Mas podem devolver a vida a alguém que está morrendo.

Dizer que todo "embrião congelado" é uma vida equivale a dizer que toda semente é uma árvore. Podemos afirmar que árvores originam-se de uma semente do mesmo modo que todos nós nos originamos de um óvulo fecundado por um espermatozóide. Mas a recíproca não é verdadeira. Sabemos que inúmeras sementes quando plantadas não germinam e nunca se transformarão em uma árvore.

E o mesmo acontece com os embriões congelados, nas clínicas de fertilização. Eles foram gerados por casais, que na sua grande maioria, não conseguiu engravidar por métodos naturais -- e por isso recorrem à fertilização assistida. Freqüentemente, sobram embriões que não serão implantados, porque o casal já teve os filhos que desejava. Então, esses embriões são congelados.

A Lei de Biossegurança, aprovada pelo congresso nacional em 2005 (por 96% dos senadores e 85% dos deputados), prevê que, após três anos, eles poderiam ser utilizados para pesquisas, desde que haja consentimento dos genitores.

Esses embriões nunca estiveram ou estarão em um útero, condição indispensável para que um óvulo fecundado possa resultar em um ser humano. Portanto, é fundamental que as pessoas entendam que NÃO se trata de aborto. Existe uma diferença fundamental nos dois casos.

No aborto, temos uma vida no útero da mãe, que, sem interferência humana, deve continuar. No caso dos embriões congelados é exatamente o contrário. Sem interferência humana -- que propiciou a união do óvulo e do espermatozóide no laboratório -- não existiria o embrião. Logo, sem a mão humana, esse embrião nunca será inserido em um útero ou destinado a pesquisas. Ficará congelado eternamente.

Os especialistas que defendem as pesquisas com CTE (células-tronco embrionárias) baseiam seus argumentos em dados científicos ou nos resultados das tentativas terapêuticas, realizadas com células-tronco adultas (CTA), aplicadas em doenças tais como: diabetes juvenil, problemas cardíacos, doenças de Chagas, derrame e doenças neuromusculares.

Todos eles são unânimes em afirmar que as experiências clínicas com CTA (embora possam contribuir com alguma melhora em alguns subgrupos de pacientes) estão longe de representar uma cura. Por isso, as pesquisas com CTE têm de continuar. Somente elas têm o potencial de gerar todos os tecidos do corpo.

Além disso, convém lembrar que todas as tentativas terapêuticas realizadas até o momento foram com CT retiradas da medula óssea do próprio paciente, o que chamamos de auto-transplante. Contudo, esse procedimento NÃO pode ser aplicado em pacientes com doenças genéticas (cerca de 5 milhões de brasileiros), pois o defeito genético está presente em todas as células.

Caros leitores, se as pesquisas com CTA fossem tão eficientes (como apregoam aqueles que são contra as pesquisas com CTE), porque haveríamos de insistir sobre a importância em continuar e aprimorar o estudo sobre as células embrionárias?

Seria tão mais fácil poder ter resultados com as CTA, não é mesmo? Elas são mais abundantes, mais fáceis de manipular e não apresentam problemas éticos. Mas precisamos estudar as CTE. Somente elas poderão nos ensinar como programar as CTA e fazê-las produzir o tecido que queremos, na quantidade necessária.

Enfim, questiono: podemos comparar a vida de jovens ou de crianças, que vêem nessas pesquisas a única esperança futura de cura, com a de um embrião congelado que nunca se tornará uma vida?

Esta decisão caberá, agora, aos ministros do STF.
 
* Mayana Zatz é geneticista, pró-reitora de pesquisa e diretora do Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de São Paulo. Também trabalha há décadas com aconselhamento genético, ajudando famílias sob risco de desenvolver problemas de saúde de origem hereditária.
 
VEJA TAMBÉM
 
O início da vida segundo as escrituras. Artigo do médico cristão Eduardo Mundim, do site Bioética e Fé Cristã.  Para conhecer outros artigos deste site CLIQUE AQUI.
 
E mais:
Uma entrevista com o geneticista metodista Warwick Kerr, publicada na edição de junho de 2006 pelo jornal Expositor Cristão: Ciência, ética e fé: o diálogo necessário. Clique aqui.
 
 
 
 
 

 

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