Por Mayana Zatz *
No ?ltimo dia 20/4, participei em Bras?lia de um debate hist?rico, a convite do Supremo Tribunal Federal (STF). Foi a primeira vez que este assunto extremamente pol?mico — o uso de c?lulas embrion?rias (CTE) para pesquisas — era discutido em uma audi?ncia p?blica. A iniciativa, digna de aplausos, teve por objetivo oferecer subs?dios aos ministros do STF para julgar uma a??o de inconstitucionalidade (Adin) contra a Lei de Biosseguran?a, aprovada em 2005, que permite as pesquisas com c?lulas-tronco embrion?rias. SAIBA O QUE S?O C?LULAS TRONCO CLICANDO AQUI.
Os opositores a essas pesquisas defendem a tese de que a vida humana come?a no momento da concep??o. Portanto, os embri?es congelados nas cl?nicas de fertiliza??o seriam "pessoas" — que n?o podem ser destru?dos para pesquisas, mesmo que essas possam resultar em futuros tratamentos que poder?o salvar in?meras vidas.
O debate todo ocorreu em torno do tema central: "Quando come?a a vida?"
No momento da fertiliza??o? Quando o embri?o implanta-se na parede uterina? Quando se forma o sistema nervoso? Quando ele pode viver independentemente da m?e? Quando nasce?
N?o existe um consenso. Afinal, cada um de n?s tem a sua opini?o, de acordo com sua experi?ncia cient?fica, cren?a ?tica ou religiosa.
A quest?o ?: o que ? vida? Todas as c?lulas do nosso corpo est?o vivas. Um cora??o, rim ou f?gado, para serem transplantados, t?m de estar vivos. Eles n?o s?o pessoas, n?o s?o seres humanos. Mas podem devolver a vida a algu?m que est? morrendo.
Dizer que todo "embri?o congelado" ? uma vida equivale a dizer que toda semente ? uma ?rvore. Podemos afirmar que ?rvores originam-se de uma semente do mesmo modo que todos n?s nos originamos de um ?vulo fecundado por um espermatoz?ide. Mas a rec?proca n?o ? verdadeira. Sabemos que in?meras sementes quando plantadas n?o germinam e nunca se transformar?o em uma ?rvore.
E o mesmo acontece com os embri?es congelados, nas cl?nicas de fertiliza??o. Eles foram gerados por casais, que na sua grande maioria, n?o conseguiu engravidar por m?todos naturais — e por isso recorrem ? fertiliza??o assistida. Freq?entemente, sobram embri?es que n?o ser?o implantados, porque o casal j? teve os filhos que desejava. Ent?o, esses embri?es s?o congelados.
A Lei de Biosseguran?a, aprovada pelo congresso nacional em 2005 (por 96% dos senadores e 85% dos deputados), prev? que, ap?s tr?s anos, eles poderiam ser utilizados para pesquisas, desde que haja consentimento dos genitores.
Esses embri?es nunca estiveram ou estar?o em um ?tero, condi??o indispens?vel para que um ?vulo fecundado possa resultar em um ser humano. Portanto, ? fundamental que as pessoas entendam que N?O se trata de aborto. Existe uma diferen?a fundamental nos dois casos.
No aborto, temos uma vida no ?tero da m?e, que, sem interfer?ncia humana, deve continuar. No caso dos embri?es congelados ? exatamente o contr?rio. Sem interfer?ncia humana — que propiciou a uni?o do ?vulo e do espermatoz?ide no laborat?rio — n?o existiria o embri?o. Logo, sem a m?o humana, esse embri?o nunca ser? inserido em um ?tero ou destinado a pesquisas. Ficar? congelado eternamente.
Os especialistas que defendem as pesquisas com CTE (c?lulas-tronco embrion?rias) baseiam seus argumentos em dados cient?ficos ou nos resultados das tentativas terap?uticas, realizadas com c?lulas-tronco adultas (CTA), aplicadas em doen?as tais como: diabetes juvenil, problemas card?acos, doen?as de Chagas, derrame e doen?as neuromusculares.
Todos eles s?o un?nimes em afirmar que as experi?ncias cl?nicas com CTA (embora possam contribuir com alguma melhora em alguns subgrupos de pacientes) est?o longe de representar uma cura. Por isso, as pesquisas com CTE t?m de continuar. Somente elas t?m o potencial de gerar todos os tecidos do corpo.
Al?m disso, conv?m lembrar que todas as tentativas terap?uticas realizadas at? o momento foram com CT retiradas da medula ?ssea do pr?prio paciente, o que chamamos de auto-transplante. Contudo, esse procedimento N?O pode ser aplicado em pacientes com doen?as gen?ticas (cerca de 5 milh?es de brasileiros), pois o defeito gen?tico est? presente em todas as c?lulas.
Caros leitores, se as pesquisas com CTA fossem t?o eficientes (como apregoam aqueles que s?o contra as pesquisas com CTE), porque haver?amos de insistir sobre a import?ncia em continuar e aprimorar o estudo sobre as c?lulas embrion?rias?
Seria t?o mais f?cil poder ter resultados com as CTA, n?o ? mesmo? Elas s?o mais abundantes, mais f?ceis de manipular e n?o apresentam problemas ?ticos. Mas precisamos estudar as CTE. Somente elas poder?o nos ensinar como programar as CTA e faz?-las produzir o tecido que queremos, na quantidade necess?ria.
Enfim, questiono: podemos comparar a vida de jovens ou de crian?as, que v?em nessas pesquisas a ?nica esperan?a futura de cura, com a de um embri?o congelado que nunca se tornar? uma vida?
Esta decis?o caber?, agora, aos ministros do STF.
* Mayana Zatz ? geneticista, pr?-reitora de pesquisa e diretora do Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de S?o Paulo. Tamb?m trabalha h? d?cadas com aconselhamento gen?tico, ajudando fam?lias sob risco de desenvolver problemas de sa?de de origem heredit?ria.
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Uma entrevista com o geneticista metodista Warwick Kerr, publicada na edi??o de junho de 2006 pelo jornal Expositor Crist?o: Ci?ncia, ?tica e f?: o di?logo necess?rio. Clique aqui.