Publicado por Herbert em Expositor Cristão - 13/04/2014

Conheça o trabalho metodista com os povos indígenas

Expositor Cristão/Marcelo Ramiro


A história da Missão Metodista Tapeporã está interligada à história do trabalho indigenista da Igreja Metodista. Foi onde tudo começou. O nome expressa a essência do projeto. Em guarani, "tape" significa caminho e "porã" quer dizer bom. A intenção é estar ao lado dos índios no bom caminho. O projeto é desenvolvido com os Kaiowás, na aldeia Bororó em Dourados-MS e em outras áreas indígenas da região. Atualmente, os responsáveis são os pastores Paulo da Silva Costa e Maria Imaculada Costa. Em fevereiro, eles completaram 30 anos de trabalho com os índios. Nesta entrevista com a pastora Ima (como é conhecida), pessoa de referência em ações indigenistas da Igreja Metodista, você vai conhecer algumas experiências, sonhos e desafios encontrados durante três décadas de missão integral.

Como foi o início do trabalho missionário com os povos indígenas?
Pra. Imaculada Costa - Em l982, a Igreja Metodista aprovou um projeto para ser desenvolvido por uma pastora na Missão Metodista Tapeporã em Dourados/MS, visto a importância da mulher Kaiowá em sua comu­nidade. Em 1983, o pastor Paulo da Silva Costa, meu marido (nos casamos em novembro desse mesmo ano), foi convidado para assumir a coordenação dessa missão, em razão do pedido de demissão do então coordenador Dr. Áureo Brianezzi. Em fevereiro de 1984 eu fui desafiada a iniciar o trabalho. Estava no último ano na Faculdade de Teologia da Igreja Metodista em São Paulo e meu marido veio morar em Dourados. A cada 15 dias eu ia para a reserva indígena onde permanecia por uma semana, vivendo e conhecendo o povo kaiowá. No início, houve uma mistura de sentimentos: raiva de mim e de tudo que eu possuía, da sociedade por tudo que eu via como presença da morte naquele povo. Também sentia compaixão, tristeza e era desafiada a ter atitude de maior compromisso e solidariedade com esse povo. Em nenhum momento, até o dia de hoje, tive dúvidas de que o Senhor aprovou minha decisão de vir e em l985 assumir como pastora da missão.

Quais foram os maiores desafios nos primeiros anos?
Penso que todos os desafios encontrados estão no fato de trabalharmos com um povo de cultura muito forte: maneira de ver o mundo, língua e tradições. Às vezes, somos muito pretensiosos achando que, por já estarmos aqui há 30 anos, os conhecemos plenamente. Mas, não é bem assim. Por isso, mesmo depois de tanto tempo, continuamos na Missão Metodista Tapeporã sendo desafiados ao constante aprendizado sobre esse povo, discutindo aquilo que é de interesse deles/as e respondendo ao "ide" do Senhor Jesus.

Como foi a experiência de criar os filhos no contexto da missão indígena?
Foi difícil! O choque inicial é grande, mas foi gratificante! Nossos filhos (Yvý e Paigý) nasceram e abraçaram a causa indígena. Estavam conosco nas reservas indígenas, brincando com as crianças, falavam o guarani, pediam para titia índia mandioca pretinha (assada na brasa), milho pretinho, sofriam quando viam nesse ou naquele lugar uma criança ou um indígena sendo discriminados e participavam de manifestos em favor dos indígenas. Em suas escolas, nas feiras escolares sempre apresentavam seus trabalhos voltados para essas populações a fim de que a sociedade envolvente conhecesse mais e fosse menos preconceituosa. Com essa caminhada a família tem aprendido muito sobre o valor da vida, o valor do outro com o qual eu caminho e ainda tem se descoberto como família feliz, se quando aquele com quem ela vive é também feliz. Com essa trajetória onde se encontram, seja na escola, trabalho ou nos divertimentos, ela, Yvý (Terra em Guarany) é conhecida por índia e ele Paigý (o que trás uma boa notícia em Guarany) é conhecido por índio ou Pajé. E os dois têm o maior orgulho de nosso ministério junto e com o povo Kaiowá.
 


 

Poderia contar uma experiência marcante ao longo desses anos de ministério?
Tive uma experiência muito sofrida, mas pude ver nela a aprovação de Deus para minha decisão de vir fazer parte da Missão Metodista. Foi, se me lembro bem, em 1987 ou 88. Ângela Almeida Snard tinha quatro filhos sendo o menor de 10 meses. Era um menino forte, saudável e lindo! Era janeiro e nós havíamos saído de férias por 20 dias. Quando voltamos fomos informados por nosso ajudante que esse menino havia falecido. Eu ficava pensando comigo mesma: Senhor como eu vou chegar lá? O que eu falo pra Ângela? Tinha vontade de fugir desse encontro, mas por outro lado, eu precisava falar com ela naquele dia. Chegando a sua casa desci do carro e pedi ao Paulo que nos deixasse a sós, e ele ficou à distância. Aproximei-me e quando abri os braços para abraçá-la ela repentinamente me segurou, próximo dos ombros, e me sacudindo disse: Se a senhora estivesse aqui, meu filho não tinha morrido. Ela só disse isso e chorou comigo, pois tinha certeza do quanto ela e seu povo são importantes para nós e que se estivéssemos lá, o carro da Missão levaria seu filho quantas vezes fosse necessário em busca da saúde que ele tanto carecia. Quantos pequeninos e grandes saíram dessa vida por falta de socorro no momento devido!

Vocês aprenderam muito com essas experiências.
É verdade. A Bíblia nos apresenta a vida como maior dom dado por nosso Deus. Nós lemos isso, concordamos, afirmamos e pregamos sobre isso, mas, às vezes, isso não tem intensidade e a força devidas. Na caminhada com esse povo, que teima em viver apesar das circunstâncias, eu aprendi na prática a valorizar, de todas as formas e com todo meu entendimento e sentimentos, a vida que tenho! Aprendi também sobre a extensão da minha responsabilidade em reconhecer que sou participante nesse mundo e como tal onde estou, preciso me responsabilizar e lutar contra tudo que produz os sinais da morte!

Como lidar com movimentos religiosos proselitistas infiltrados na reserva indígena?
Complicado! De certa forma, toda religião diferente da sua pratica o proselitismo ou é o resultado dele. Isso porque quaisquer lideranças religiosas dentro da Reserva Indígena se dão por meio do próprio indígena que recebe a orientação de suas Igrejas mães na cidade. São eles os líderes religiosos. São eles os pastores. E nosso cuidado em atuar é grande. O que nos diferencia é nosso modo de ser Igreja. Nossa ação nos diferencia e todas as Igrejas e movimentos religiosos e os próprios líderes distinguem isso muito bem. Temos uma ação integral. Como Igreja, trabalhamos o todo do ser humano. Nossa responsabilidade não é apenas com a Igreja que surgiu com o tempo, mas é com toda comunidade indígena. Caminhamos junto com as escolas, junto à saúde, junto ao lazer etc. Nas situações de crises entre famílias, relacionamento entre pais e filhos, marido e mulher. Eles/as são orientados por seus próprios líderes a procurarem o pastor e a pastora da Missão Tapeporã.

Qual foi a maior prova de confiança recebida dos índios em relação à missão metodista?
Certamente foi a que veio do Capitão Ireno Snard, liderança maior do povo Kaiowá. Em março de 1993, um dia antes de sua morte, ele chamou o Paulo e eu. Deitado em sua casa, pegou a mão do Paulo e a minha e nos pediu para nunca deixarmos o povo sozinho. Nossa alegria era ter confirmado a certeza de que ele sabia o quanto seu povo era importante para nós e confiava em nós como representantes da Igreja Metodista ali em sua reserva indígena.
 


 

Vocês vivenciaram momentos de demarcação de terra, ondas de suicídios, subnutrição etc. Qual a importância da igreja em situações como essas?
Vivemos e continuamos a vivenciar todos os dias. A importância é que eles/as tenham certeza de que podem contar conosco e que a luta por preservarem suas vidas e terem os seus direitos adquiridos enquanto povo indígena é a nossa também. Para a Missão Tapeporã não importa se um membro fique retido pelos indígenas que lutam pela demarcação de terras (como foi o que aconteceu na Reserva Indígena do Piracuá), ou se tenhamos que esclarecer, noite e dia, a comunidade sobre a necessidade da busca pela saúde e educação. Se tenhamos que tratar problemas familiares que a cada dia se agravam pela presença do álcool e drogas ou ainda se tenhamos que chorar com eles/as suas mortes pelo suicídio. Mas, é o caminhar junto, no dia a dia, mostrando que tudo que acontece com eles/as para nós é de suma importância e motivo de continuidade de nossa caminhada.


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