Ministério pastoral em busca de novos caminhos






  Falar a linguagem de seu tempo sem perder de vista o compromisso de serem fi?is aos ensinamentos das Escrituras e ? voca??o pr?pria: esse ? o constante desafio a pastores e pastoras.


As experi?ncias do passado distante e de tempos mais recentes deixaram suas marcas no cristianismo. As li?es que ensejaram s?o fatores importantes no processo contempor?neo de pensar a rela??o do Evangelho com o "mundo da vida" – para, ent?o, conhecer esse mundo a fim de expressar essa rela??o de testemunho em modos de a??o e categorias que correspondam ao tempo presente. Essas atualiza?es devem responder, tamb?m, n?o sem escrut?nio, ?s novas configura?es pol?ticas e suas conseq??ncias na vida individual, familiar e social. Cabe a cada gera??o criar novas pedagogias pastorais que tornem o minist?rio pastoral da Igreja for?a importante para ir ao encontro das necessidades espirituais de pessoas, fam?lias e comunidades. Que seja resposta, tamb?m, ?s mudan?as em andamento na sociedade.Cabe a n?s descobrir os elementos essenciais da f? que preservem a integridade da mensagem do Evangelho e o respeito ? pessoa humana em meio ?s muta?es, instabilidades e modismos de nossos tempos.


Nas linhas que se seguem, submetemos algumas indica?es que, a nosso ver, podem realimentar o minist?rio pastoral e pavimentar caminhos significativos para a a??o movida pela f? crist? no contexto atual. Intentam, tamb?m, corresponder ao atual momento pol?tico-cultural, sem perder suas ra?zes e motiva?es na Palavra de Deus. Al?m disso, pretendem indicar atitude de di?logo com a sociedade onde a Igreja est?, inevitavelmente, inserida. Afinal, a mensagem crist? oferece, al?m do an?ncio da salva??o pessoal por meio de Jesus Cristo, crit?rios de valores que iluminam caminhos para que a humanidade desfrute paz, alegria e vida em abund?ncia. Trata-se, ent?o, de buscar modalidades de minist?rio pastoral pautadas por atitude aberta, corajosa, sem excluir o exame cr?tico de id?ias e pr?ticas que germinam no s?culo. Pretendem indicar um padr?o de servi?os pastorais de frente para a vida. Enunciamos abaixo sete considera?es que, em nosso entender, representam correspondentes pautas de a??o para viabilizar o encontro pastoral com o mundo contempor?neo.


1 Indiv?duos e fam?lias parecem viver numa "sociedade sem pais". H? sinais de destrui??o de v?nculos humanos. H? descren?a generalizada nos pol?ticos e na pol?tica partid?ria. H? desencanto por causa da corrup??o. As pr?prias condi?es atuais de perda de ra?zes, as migra?es em busca de melhores oportunidades de trabalho e de educa??o geram desequil?brios, ansiedades, ang?stias e temor. Muitas pessoas e fam?lias sentem-se impotentes para conviver com as turbul?ncias pr?prias da exist?ncia e com as presentes conting?ncias humanas. Por isso, o exerc?cio do cuidado pastoral em suas formas mais tradicionais como a prega??o, a educa??o na f?, a conviv?ncia solid?ria e, em suas formas mais especializadas, como o aconselhamento pastoral, a diaconia, entre outras, junto a indiv?duos e fam?lias, continua a ocupar lugar central. Exige, ? claro, constante revis?o e preparo de seus agentes. Mas, a aten??o pastoral a fam?lias e pessoas deve incluir o encorajamento aos membros de nossas igrejas para envolver-se em programas e atividades do bairro ou cidade que visem ? solu??o de problemas que, em muitos casos, s?o geradores de dificuldades e sofrimento na vida pessoal. A aus?ncia de aten??o a essa dimens?o maior dos problemas humanos tem sido a grande lacuna da pr?tica do cuidado pastoral, fortemente focalizada no indiv?duo e suas rela?es interpessoais. Essa n?o deve excluir aquela!







 2 – Observa-se hoje que as raz?es principais que levam as pessoas a procurar ajuda pastoral s?o quest?es do cotidiano.  


 A preocupa??o com o dia-a-dia ? maior do que a busca por melhor explica??o das doutrinas estabelecidas pela Igreja.Al?m disso, o corpo doutrinal de grande parte dos membros das igrejas na atualidade ? muito el?stico. Isso se deve, em parte, ao surgimento recente de novas igrejas e ? assimila??o, ?s vezes impercept?vel, de "doutrinas" via r?dio e televis?o. As "doutrinas" s?o escolhidas ao sabor de necessidades e perspectivas que as pessoas v?o adquirindo com o evolver dos anos. Al?m disso, a super valoriza??o da experi?ncia pessoal ? tend?ncia, em detrimento das doutrinas. As quest?es do dia-a-dia que movem os sentimentos das pessoas, tais como viol?ncia, separa?es, desemprego, doen?a, desesperan?a entre outras emergem como prementes e merecedoras de maior aten??o para o exerc?cio atualizado do minist?rio pastoral. Os meios tradicionais da Gra?a e os recursos advindos do conhecimento dessas situa?es e de suas causas s?o indispens?veis.


3 – A "nova" moralidade, acentuadamente individualista, n?o apenas no que tange ? ?rea da sexualidade, merece aten??o e exame de suas alega?es. Uma poss?vel explica??o para a defesa, por amplos segmentos da popula??o brasileira, de uma moralidade emergente, seria fruto da impunidade, da falta de confian?a nos pol?ticos e na persist?ncia da corrup??o. Essas "doen?as da alma brasileira" abalam convic?es pessoais. Tornam relativas, se n?o extinguem, preocupa?es com a pr?tica do bem, com o auto-respeito e o respeito pelo outro, que se evidenciaria na conduta pessoal, financeira e profissional, em particular, de muitos pol?ticos, dirigentes esportivos e outros.


4 – A aten??o ? tend?ncia ? participa??o em comunidades menores, sem longa trajet?ria institucional, embora ligadas ?s tradi?es do cristianismo, deve ser considerada.







 A solidariedade encontrada nas pequenas comunidades, ou em suas reuni?es em recintos dom?sticos, contrasta com a indiferen?a encontrada, muitas vezes, nas grandes igrejas.  


 Mas, ao mesmo tempo, provavelmente por busca de autentica??o social (status) ou por for?a da m?dia, muitos freq?entam as mega-igrejas. Ou, talvez, em virtude da atual onda de "espetaculariza??o" da religi?o, cujas reuni?es em muito se assemelham a "programas de audit?rio". Parece que tanto as mega-igrejas como os pequenos grupos s?o "novos lares" para as pessoas que buscam solidariedade, amizade e sentido espiritual para suas vidas na atualidade. Nesse particular o risco ? comprometer-se a unidade do Corpo de Cristo e os v?nculos essenciais com a Igreja.


5 – A quest?o da solidariedade. O termo, em virtude de seu uso, ?s vezes em excesso, precisa ser depurado de sentidos apenas pontuais e compreendido de maneira mais ampla. A solidariedade ? pr?tica e conceito que nos coloca a n?s humanos como parte de uma teia de rela?es: inclui o planeta, o cosmos, a natureza e todas as suas ramifica?es. Pela solidariedade nos irmanamos ao entorno que circunda nossa exist?ncia e que continuar? a nos cercar ap?s nossa morte. Essa consci?ncia mostra a import?ncia da compreens?o da natureza, das m?ltiplas rela?es envolvidas emnosso viver e de nosso semelhante como parte dessas rela?es vitais. A solidariedade abre caminhos para que pessoas e igrejas se encontrem e concentrem seus esfor?os na busca de solu?es para as agudas quest?es ligadas ? exist?ncia. Trata-se de encontrar Deus, o Transcendente, no imanente da vida di?ria, abrindo, assim, caminhos menos ?speros para a longa peregrina??o humana. As a?es de solidariedade, entretanto, se fragilizam se desenvolvidas meramente em n?veis interpessoais. A pr?tica da solidariedade deve abrir-se ? partilha da f? que move nossa esperan?a, nossas atitudes e nossa participa??o na vida p?blica. N?o necessariamente em partidos pol?ticos convencionais, na den?ncia de situa?es abusivas do poder, assim como a colabora??o com iniciativas que pleiteiam uma vida mais humana e um planeta mais limpo. H? uma outra possibilidade espec?fica, aparentemente in?cua e simplista, a ser ativada pela participa??o conjunta das igrejas e: a?es organizadas contra o consumo de bens e produtos de empresas que usem crian?as como empregadas, que mantenham trabalhadores e trabalhadoras em regime de escravid?o, ou que contribuam para a contamina??o do meio-ambiente. Por exemplo: a Igreja Metodista na Alemanha decidiu, em Conc?lio, n?o usar mais copos de pl?stico em suas reuni?es; a Igreja Metodista dos Estados Unidos, h? tempos atr?s, fez um belo boicote de produtos comercializados em que as empresas exploravam m?o-de-obra barata em outros pa?ses.


6 – A nova aproxima??o entre religi?o e ci?ncias deve ser considerada no di?logo do cristianismo com a sociedade. O reconhecimento de suas compet?ncias e campos espec?ficos de suas contribui?es para o bem-estar humano permite, hoje, ressalvadas exce?es, em novo patamar de relacionamento. Ou seja, ? poss?vel estabelecer rela??o correta entre o que cremos e o que sabemos. Por outro lado, o mundo n?o se constitui apenas de fatos, mat?ria prima das ci?ncias.







  O mundo ? constitu?do, tamb?m, de conhecimento, opini?es, convic?es, padr?es de comportamento e de cren?a.


 Igualmente, nossa percep??o do mundo e a busca por dar sentido ? exist?ncia e ? hist?ria baseiam-se em legados das gera?es que nos precederam. Por sua vez, essas heran?as fundamentam-se nas din?micas tradi?es do cristianismo, na cultura, nos costumes e em outras constru?es sociais. A verdade da religi?o ? um "a priori em rela??o a uma vis?o cient?fica do mundo"; a f? "nasce num ponto da exist?ncia humana que ? anterior ao ponto de partida da reflex?o cient?fica". A "imagem de mundo" constru?da pelas ci?ncias n?o pode avocar a si o julgamento da f?; as ci?ncias, devidamente enquadradas, n?o se contrap?em ? f?. No caso de conflito ? necess?ria a autocr?tica. Al?m de tudo, "prozac e drogas semelhantes" n?o s?o capazes de acalmar a "noite tenebrosa da alma".







 7 – A atual supremacia da competi??o e da comercializa??o disseminada na aldeia globalizada se instalou, igualmente, no interior de igrejas alinhadas com o cristianismo. 


? fator ponder?vel que ergue barreiras para a credibilidade da Igreja, na recep??o pelo mundo contempor?neo da mensagem crist?. Ademais, a competi??o aninha sentimentos de superioridade, de arrog?ncia e conseq?ente rigidez doutrin?ria, acobertada por "argumentos" de "pureza da f?", de "defesa dos aut?nticos valores crist?os". Acompanham-na atitudes de desapre?o e at? mesmo de exclus?o de outras igrejas e grupos de pessoas que n?o partilham as mesmas ?nfases teol?gicas.


Concluindo, o fasc?nio que a voca??o pastoral exerce sobre muitos de n?s e sua abrang?ncia muito al?m dos limites institucionais tradicionais ? o que nos leva a submeter essas anota?es a colegas, a leitoras e leitores interessados na miss?o da Igreja na atualidade. Outros caminhos v?o se abrindo ? medida que interagimos em resposta aos desafios desses "sombrios" tempos atuais. O di?logo com a sociedade ?, tamb?m, express?o de nosso compromisso com o Evangelho que nos convoca: "V?s sois a luz do mundo. N?o se pode esconder a cidade edificada sobre um monte; nem se acende uma candeia para coloc?-la debaixo do alqueire, mas no velador, e alumia a todos os que se encontram na casa" (Mateus 5.14-15).


 


Rev.Ronaldo Sathler-Rosa


Professor da Faculdade de Teologia e da P?s-Gradua??o em Ci?ncias da Religi?o da UMESP. Adaptado de "A nova cidadania do cristianismo: da tutela ? imers?o", artigo de Ronaldo Sathler-Rosa, publicado em Estudos de Religi?o, 32, 2007.

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